sexta-feira, 24 de junho de 2011

"A Velha Ordem Mudou"

"A primeira regra da justiça é preservar a alguém o que lhe pertence: essa regra consiste não apenas da preservação dos direitos de propriedade, mas ainda mais da preservação dos direitos da pessoa, oriundos de prerrogativas de nascimento e posição. [...] Dessa regra de lei e equidade segue-se que todo sistema que, sob a aparência de humanitário e beneficente, tenda a estabelecer uma igualdade de deveres e destruir as distinções necessárias levará dentro em pouco à desordem (resultado inevitável da igualdade) e provocará a derrubada da sociedade civil. A monarquia francesa, pela sua constituição, é formada de vários Estados distintos. O serviço pessoal do cleto é atender às funções relacionadas com a instrução e o culto. Os nobres consagram seu sangue à defesa do Estado e ajudam o soberano com seus conselhos. A classe mais baixa da Nação, que não pode prestar ao rei serviços tão destacados, contribui com seus tributos, sua indústria e seu serviço corporal. Abolir essas distinções é derrubar toda a constituição francesa".

In: Huberman, Leo. História da Riqueza do Homem. Ed. 20. Zahar Editores: Rio de Janeiro, 1985, pp. 155-156.

Esta foi a posição do Parlamento Francês quando, em 1776 (ano da independência dos EUA e da publicação da Riqueza das Nações), Turgot - ministro das finanças da França - pensou em cobrar impostos do Clero e da Nobreza. 13 anos depois, a Bastilha era tomada pela "classe mais baixa da Nação". Num período de transição, de emergência de uma nova ordem social, os privilegiados tentam conservar sua posição. Nesta época, a burguesia também defendia o direito de propriedade: da sua. A história, no entanto, não pára...

quinta-feira, 23 de junho de 2011

"O Curriculum Mortis e a Reabilitação da Autocrítica", de Leandro Konder

A sociedade, modernizada, precisa de organização, eficiência. Para obter um emprego, para conseguir uma promoção, fazer carreira, o sujeito precisa exibir suas qualidades, ostentar seus êxitos. Já existem até manuais que ensinam o cidadão a preparar seu curriculum vitae. A trajetória ascensional de cada um depende dessa peça de literatura, que lembra as antigas epopéias, porque nelas o protagonista – o herói – só enfrenta as dificuldades para poder acumular vitórias. Os obstáculos servem apenas para realçar seu valor. O passado é reconstituído a partir de uma ótica descaradamente “triunfalista”.

Evidentemente, trata-se de uma imagem que não corresponde à realidade. Em sua imensa maioria os seres humanos não são campeões invictos, não são heróis ou semideuses. Se nos examinarmos com suficiente rigor e bastante franqueza, não poderemos deixar de constatar que somos todos marcados por graves derrotas e amargas frustrações. Vivemos uma vida precária e finita, nossas forças são limitadas, o medo e a insegurança nos freqüentam; e nada disso aparece no curriculum vitae de cada um de nós.

O curriculum vitae é a ponta do iceberg: ele é o elemento mais ostensivo de uma ideologia que nos envolve e nos educa nos princípios do mercado capitalista; é a expressão de uma ideologia que inculca nas nossas cabeças aquela “mentalidade de cavalo de corrida” a que se refere a escritora Dóris Lessing. Não devemos confessar o elevado coeficiente de fracasso de nossas existências, porque devemos ser “competitivos”. Camões, o genial Camões, autor de tantos poemas líricos maravilhosos, não poderia colocar em seu curriculum vitae o verso famoso: “Errei todo o discurso dos meus anos”.

A ideologia que se manifesta no curriculum vitae, afinal, aumenta as nossas tensões internas, porque nos dificulta a lucidez e a coragem de assumir o que efetivamente somos; nos obriga a vestir o uniforme do “super-homem”, a afetar superioridades artificiais. Além disso, ela incita à mentira, gera hipocrisia. Por sua monstruosa unilateralidade, a imagem do vitorioso, que ela nos obriga exibir, empobrece o nosso conhecimento de nós mesmos, prejudica gravemente a sinceridade da nossa auto-análise.

É uma ideologia capaz de explorar tanto a burrice como a inteligência; capaz de influir tanto sobre as vaidades primitivas como sobre as culturas refinadas. Para os indivíduos intelectualizados, ela se reveste de máscaras altamente sofisticadas. No caso dos artistas, ela usa a mitologia da genialidade e induz freqüentemente a pessoa a se alimentar de ambições desmesuradas. No caso dos intelectuais em geral, ela se apóia nos mecanismos seletivos da carreira universitária, aproveita as exigências de “publicidade” que se tornaram tão fortes na vida moderna e instiga uns a se afirmarem contra os outros: diminui a simpatia espontânea pelos colegas, a disposição real para aprender com eles, e se fortalece a desconfiança, cresce o impulso no sentido de demonstrar sua própria competência através da denúncia da incompetência alheia.

Claro que não teria sentido imaginarmos que o quadro deveria ser idílico e sonharmos com uma situação na qual os indivíduos jamais colidissem uns com os outros. Sabemos que as contradições nunca vão ser inteiramente suprimidas, que a existência delas é uma dimensão essencial da própria realidade. Sabemos também que o apreço por si mesmo é importante para todo ser humano: se não gostar de si mesma, nenhuma pessoa conseguirá gostar saudavelmente de outra; se não acreditar de fato em suas convicções, não conseguirá comunicá-las a outras pessoas, não conseguirá intervir no mundo, contribuindo para melhorá-lo. A partir de um determinado nível, contudo, a auto-estima fica sobrecarregada de narcisismo e acarreta uma atrofia conservadora da autocrítica.

Podemos então deixar de lado as condenações moralista – inócuas – do narcisismo. Elas são antigas e apresentam escasso interesse teórico. O problema que merece a nossa preocupação é outro: é aquele que se manifesta no efeito conservador da autocomplacência, que coagula o movimento auto-renovador da consciência, enrijecendo-lhe o ímpeto criativo e a abertura para o novo.

É provável que a estrutura da mente humana seja muito mais conservadora do que costumamos reconhecer. Renovar-se, reformular suas idéias, modificar seus valores, é operação dolorosa e arriscada. Quem parece realizá-la com alegre desenvoltura é o espírito frívolo, superficial e sem raízes, que está sempre disposto a acolher as novidades porque na realidade não as assimila (já que não assimila profundamente coisa alguma). Quando a vida obriga o ser humano a mudar os critérios e valores a que ele já tinha se acostumado e nos quais fundara a sua segurança, é natural que ele se angustie. Os próprios neuróticos, embora sofram, se agarram à neurose, porque têm medo de cair em um sofrimento ainda maior.

Nossas sociedades fragmentadas, divididas em grupos, em classes, em nações, em blocos de Estados, tornam muitíssimo mais difícil uma tarefa que por si mesma já é extremamente espinhosa: a de conhecermos as camadas mais profundas da realidade em que vivemos, penetrando gradualmente na essência mais significativa dos fenômenos, enxergando as coisas de um ângulo verdadeiramente universal, quer dizer, comum à humanidade como um todo. A humanidade está dilacerada, os indivíduos não sabem como agir para se tornarem uma encarnação dela. Não sabem o que há de mais universal neles. E isso contribui para que eles desistam da universalidade e se resignem a ser facciosos, unilaterais.

Sofremos todos a brutal pressão decorrente desse quadro, dessas condições. No entanto, volta e meia, no esforço para mudar o mundo, sentimos necessidade de nos unir a outros seres humanos em torno de princípios, que, por definição, precisam ser universais. Como superar o estreitamento dos nossos horizontes, provocado pelo mercado hipercompetitivo, que nos joga constantemente uns contra os outros? Os mecanismos do mercado forçam as pessoas a buscar lucros cada vez maiores, a disputar um lugar de trabalho melhor remunerado, ameçam-nas com o desemprego e a miséria, intimidam-nas com a falência; além disso, disseminam a insegurança e produzem a cristalização não só dos interesses materiais como dos modos de sentir e de pensar. Fortalece-se, nas criaturas, a exigência de forjar álibis.

Marx e Freud descobriram aspectos decisivos da ação das forças que atuam subterraneamente em nós e mostraram que, sob uma capa de “racionalidade”, elas impõem limites aos movimentos da nossa consciência. Mostraram como esquemas explicativos são elaborados e reelaborados em nossas cabeças com a finalidade de nos proporcionar a “boa consciência”, com o objetivo de amenizar nossas dúvidas, atenuar nossas inquietações e evitar a vertigem das nossas inseguranças.

Forjamos para nós imagens que nos ajudem a viver; e nos apegamos a elas. O autoritário se apresenta como “enérgico” e “corajoso”; o oportunista como “prudente” ou “realista”; o covarde com “sensato”; o irresponsável como “livre”. Não existe nenhuma tomada de posição no plano político ou filosófico que, por si mesma, imunize a consciência contra a ação desses mecanismos. Somos todos divididos, contraditórios. Por isso mesmo, precisamos promover discussões, examinar e reexaminar a função interna das nossas racionalizações. Quer dizer: precisamos realizar permanentemente um vigoroso esforço crítico e autocrítico.

A autocrítica é de uma importância decisiva. É por ela que passa o teste da superação do conservadorismo dentro de nós. Um conservador – é claro – pode fazer autocrítica; mas, se a autocrítica for feita mesmo para valer, ele seguramente não estará sendo conservador no momento em que a fizer.

Desde que consiga se instalar solidamente na consciência de alguém, o conservadorismo pode administrar uma grande flexibilidade: pode suportar com tolerância liberal as opiniões divergentes, até as provocações e irreverências alheias. Mas não pode se permitir o autoquestionamento radical.

George Bernard Shaw, que conhecia a significação da autocrítica, disse uma vez que o erudito era um homem que se valia de seus conhecimentos para criticar os outros, ao passo que o sábio era um homem que se criticava a si mesmo. No sentido que Shaw atribuiu à palavra, Marx era um sábio, porque não se limitou a criticar os outros, mas também cultivava – e como! – a autocrítica. Embora suas idéias sirvam de base para as certezas de milhões de militantes que invocam seu nome, Marx declarou a sua filha que, se tivesse de adotar um lema, seria a frase latina que recomendava duvidar de tudo: de omnia dubitandum. Ao completar cinqüenta anos de idade, numa situação de extrema pobreza, Marx escreveu para Engels uma carta (30.04.1868) na qual ria de sua própria incompetência para ganhar dinheiro: “Como minha mãe tinha razão quando dizia o Karl defia saper kanharr o capital (enfez de eskreferr sopre ele)...” (Marx imita jocosamente na carta a pronúncia de sua mãe). Em outra carta para o mesmo amigo de sempre concordava com uma observação de sua mulher, Jenny, que assegurava que, embora vivessem muito mal, após a vitória da revolução o casal passaria a viver pior, porque “teria o prazer de ver todos os charlatães comemorarem o triunfo deles.“ (11.12.1858). Marx não excluía a priori a hipótese de estar fazendo, em determinadas situações, papel de bobo.

Esse espírito autocrítico está presente também em Engels e em alguns marxistas de épocas posteriores, com Gramsci e Walter Benjamin. Ele assume traços de ascetismo nos anos “heróicos” do leninismo “puro”, mas se deteriora na ação dos partidos comunistas colocados sob a liderança de Stálin. A autocrítica se desmoraliza, deixa de ser um ajuste de contas do indivíduo consigo mesmo e é delegada à mecânica das agremiações: o militante faz a autocrítica que a direção do partido lhe impõe.

Agora, com os impasses com que se defronta o movimento comunista, com a ampla exigência de uma renovação do marxismo (no espírito de Marx), estão sendo criadas condições para que também os comunistas reaprendam o sentido da genuína autocrítica.

A verdadeira autocrítica exige uma espécie de “complementação negativa” para o curriculum vitae: depois de apregoar seus êxitos e seus méritos, a pessoa enfrenta o desafio de reconhecer suas frustrações, suas deficiências, seus fracassos, suas fraquezas. Talvez possamos chamar essa reconstituição dolorosa e necessária de curriculum mortis. Os indivíduos mais gravemente contaminados pela ideologia “triunfalista” que se manifesta no curriculum vitae carecem de sensibilidade, de madura lucidez e de coragem intelectual para a elaboração desse curriculum mortis. Eles agem como aquele político conservador que, numa entrevista, respondendo a uma pergunta sobre o maior erro que admitia ter cometido, explicou à estarrecida jornalista: “Meu maior erro tem sido o de dizer as coisas antes de todo mundo, cedo demais, quando os espíritos ainda não estão preparados para compreendê-las; isso desencadeia uma reação muito forte contra o meu pioneirismo.” Num passe de mágica, a autocrítica se transforma em auto-elogio.

Em nossos tempos de desconfiança, esses lances de prestidigitação tendem a surtir cada vez menos efeito. E, mesmo quando ainda conseguem iludir alguns incautos, eles trazem para os mistificadores talentosos vantagens precárias, pelas quais o mágico, afinal, acaba pagando, humanamente, um preço mais elevado do que supõe. Querendo ou não, cada um de nós caminha inexoravelmente para a morte (e o prestidigitador não escapa a esse destino). Reconhecendo francamente nossos fracassos, elaborando nosso curriculum mortis, assumindo autocriticamente os momentos “noturnos” em que vamos morrendo aos poucos, aumentamos as nossas possibilidades de nos conhecermos e de nos aperfeiçoarmos espiritualmente; e, de certo modo, esse talvez seja o único caminho possível de preparação para o fim pessoal inevitável. Quem insiste em se iludir, na realidade, está optando por enfrentar despreparado todas as dores que lhe vão desabar em cima, na hora da desilusão. Os indivíduos que conseguem se elevar a um ângulo mais universal e conseguem discernir com clareza as limitações do ser particular deles, em princípio, devem estar em condições menos ruins para se defrontar com a morte (já que são capazes de reconhecer algo – a humanidade, Deus – acima de suas individualidades; e esse algo não morre).

A abordagem do tema da morte, aqui, pode parecer surpreendente; os marxistas não costumam escrever a respeito desse assunto (e há quem alegue, com alguma ligeireza, que a omissão se deve ao fato de eles se ocuparem preferencialmente dos problemas da vida). Na verdade, a compreensão de alguns dos problemas da vida só pode se aprofundar se nos dispusermos a refleti também sobre a morte, E há um precedente da maior importância na reflexão dialética sobre a morte; ele se encontra na Fenomenologia do Espírito, de Hegel.

Nesse livro, Hegel estuda – num nível notoriamente muito abstrato – o movimento da consciência, que parte da percepção sensível, imediata, e caminha para o que ele chama de saber absoluto. Em sua trajetória, a consciência assume diferentes figuras, A quarta figura desse itinerário é a autoconsciência e a quinta é a razão. Pois bem: para passar da autoconsciência à razão, é preciso pensar a fundo a questão da morte.

Para Hegel, a autoconsciência é uma figura na qual a consciência analisa as coisas, vai completando seu campo de entendimento, mas tende inevitavelmente a se encerrar em si mesma, a excluir o novo, a deixar de fora o negativo; ela tende então a se encastelar numa positividade enrijecida. Na medida em que sente necessidade de avançar, a consciência precisa, por conseguinte, superar essa figura; precisa se desembaraçar da sua segurança artificial, vencer seu medo, encarar o negativo. E a forma universal do negativo é, precisamente, a morte.

A conquista da razão, portanto, depende – segundo Hegel – da capacidade que a consciência venha a adquirir de olhar a morte de frente, aproximar-se dela, permanecer junto dela, conviver com sua presença assustadora (em vez de contorná-la e fingir que ela não existe). Só assim a consciência consegue se enriquecer, assumindo seriamente seus limites, incorporando – dolorosamente – a dimensão do negativo à sua compreensão do mundo e de si mesma. “O Espírito” – lê-se na Fenomenologia do Espírito – “só conquista a sua verdade quando é capaz de se encontrar a si mesmo na mais absoluta dilaceração.”

Essa indicação preciosa se perdeu, na história das lutas travadas pelos herdeiros da dialética hegeliana. A consciência dos marxistas, com o tempo, começou a apresentar sintomas daquela positividade enrijecida a que se referia o autor da Fenomenologia do Espírito. Difundiu-se uma concepção simplificadora, maniqueísta, da revolução: em rígida contraposição à “corrupção” burguesa, as organizações revolucionárias eram levadas forçosamente a exagerar sua “autenticidade nuclear”, sua “justeza fundamental” (minimizando conseqüentemente todas as deformações internas, todas as graves anomalias que se verificavam em seu interior). A genuína autocrítica definhou, o “triunfalismo” se impôs. Os revolucionários foram envolvidos por uma ideologia que não lhes cobrava maior empenho em crescerem porque os convencia de que já eram bastante grandes; uma ideologia que não os pressionava no sentido de indagarem mais a respeito das coisas e deles mesmos, porque lhes sugeria que eles já tinham as respostas essenciais.

Mas a história se rebelou contra os que proclamavam seus direitos sobre ela. A prática desmoralizou a teoria que se considerava sua carcereira e fugiu por todas as janelas. E o revolucionário foi obrigado a constatar, como qualquer homem comum, que a morte o está devorando a cada momento. Volta a se colocar, então, em nome da vida, a necessidade de incorporar o negativo à consciência. Através da autocrítica. Ou – se a expressão em latim não lhes parecer muito rebarbativa – através do curriculum mortis.

KONDER, L. O Marxismo na Batalha das Ideias. Ed 2. Ed. Expressão Popular: São Paulo, 2009, pp. 53-61.

Publicado originalmente na revista Presença (São Paulo), n. 1, 1983.

sábado, 18 de junho de 2011

Meteoro

Ontologia é uma palavra feia. Parece ser coisa de outro mundo! Não é à toa que, na tradição filosófica, ela é reconhecida geralmente como da área da metafísica. Nós, meros mortais, que pensamos não termos nada de filósofos, acreditamos nunca ter pensado nada em termos ontológicos. Aliás, se não fosse tão incomum e se, por outro lado, tivesse algum apelo comercial, poderíamos começar a encontrar ontologias sendo vendidas em cada lojinha de R$ 1,99.

Acontece, entretanto, que, se a palavra é pouco usual, o seu significado é utilizado mais do que coca-cola. Quem nunca disse ou nunca ouviu a seguinte afirmação: "o ser humano é uma droga mesmo", o "homem é essencialmente egoísta", "a natureza humana é individualista", etc. etc. Todas estas afirmações são de caráter ontológico, porque são definições gerais sobre o "ser" e, neste caso, sobre um ser específico: o ser humano. Ao definir o que é essencialmente um ser, você automaticamente define os limites estruturais para além dos quais nenhuma alteração é possível. No caso acima, se a essência humana é individualista, egoísta, mesquinha, etc. a sociedade capitalista é a forma social adequada àquela essência e qualquer proposta de transformação social está condenada a priori ao fracasso por esbarrar nos limites da tal da natureza humana.

A História, no entanto, nos ajuda um pouco na desmistificação disso. Se a natureza humana é tal como definida acima, significa que Aristóteles estava certo ao dizer que os escravos eram apenas "animais falantes"; que, afinal, não foi perda de tempo a célebre discussão no interior da Igreja Católica à época dos "descobrimentos" da América sobre a humanidade ou não dos nativos de além-mar; que os aproximadamente 80 mil anos de existência humana anterior ao surgimento das primeiras sociedades de classe eram anti-naturais.

Para aqueles que não gostam de História por considerar que isso é coisa de velho e que não é importante porque não estava vivo naquela época, o filme "Meteoro" ajuda a desmistificar toda esta ontologia formada enquanto ideologia no curso de desenvolvimento da sociedade burguesa ocidental. O filme conta a história de um grupo de trabalhadores que, após a construção de Brasília, se dedica a abrir as estradas que ligarão a nova capital federal plantada no centro do cerrado ao resto do país. Durante o planejamento da construção da estrada que ligará Brasília à Fortaleza, estes trabalhadores encontram um imenso deserto, que, entre outras coisas, dificulta a realização do projeto, a não ser que eles encarassem o desafio hercúleo e estúpido de cortar o deserto no braço. Enquanto eles aguardam orientações quanto ao "quê fazer", vem o Golpe Militar e eles ficam esquecidos no meio do nada.

Todo o filme narra, então, o esforço empreendido por estas pessoas para sobreviverem em sociedade em um meio ambiente completamente hostil, contando apenas com algumas ferramentas e os seus conhecimentos sobre a vida "civilizada". Dadas as novas condições sociais de sobrevivência, eles criam uma nova organização social.

É muito interessante, porque, dentre outras coisas, este filme é baseado em uma história real.

Assistam! É sempre bom variar um pouquinho!


Ano: 2007

Diretor: Diego de la Texera

Elenco: Cláudio Marzo, Nicolas Trevijano, Daisy Granados, Maria Dulce Saldanha, Leandro Hassum, Luci Ferreira, Paula Bulamarqui.

Sinopse: Na década de 60, durante o período desenvolvimentista, iniciado por JK, um grupo de trabalhadores inicia a construção da estrada Brasília-Fortaleza, para ligar a nova capital com o nordeste brasileiro. Porém, em 1964 com o golpe militar, os trabalhadores são esquecidos no meio do nada junto com um grupo de prostitutas que os visitava mensalmente. Assim, trabalhadores e prostitutas, acabam por fundar a nova sociedade de Meteoro.

Formato: AVI Tamanho: 816 Mb

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terça-feira, 7 de junho de 2011

Cronicamente Inviável

Lançamento: 2000 (Brasil)

Direção: Sérgio Bianchi

Elenco: Cecil Thiré, Betty Gofman, Dan Stulbach, Daniel Dantas

Formato: Avi Tamanho: 693 Mb

Sinopse: As relações entre frequentadores, proprietários e empregados de um prestigiado restaurante de São Paulo são as pedras de toque para descortinar uma ácida visão da crise brasileira. Entram em foco as mais surpreendentes situações de aproximação e conflito entre diferentes raças e classes sociais, de várias regiões do país, revelando, sem qualquer concessão, a impossibilidade de uma cultura nacional homogênea.

Alfredo viaja pelo Brasil realizando pesquisas para escrever seu novo livro. Vive e tenta compreender os problemas de dominação e opressão social. Adam, descendente de poloneses, sofre com a discriminação de outros imigrantes europeus em sua cidade no Paraná. As histórias de um e outro convergem para o restaurante em São Paulo, onde Adam vai trabalhar como garçom e Alfredo encontrar os amigos: Luís, Maria Alice, Carlos e Amanda. Maria Alice e Carlos são um casal de família tradicional do Rio de Janeiro. Ela tem uma postura idealista diante dos problemas sociais. Carlos é um economista que acredita no pragmatismo e na racionalidade do capitalismo. Amanda, de origem pantaneira e passado nebuloso, é gerente do restaurante. Luís, o proprietário, é um homem de meia idade, refinado, com a distinção das boas maneiras, ao mesmo tempo irônico e pungente. Acredita na civilidade como forma de defesa ante a violência social.

Adam introduz a subversão na ordem do restaurante. Destaca-se dos demais empregados tanto pelo aspecto físico, quanto por sua insubordinação e virulência. Sua presença expõe a fragilidade dos acordos sociais e a desestabilização atinge a todos, incluíndo Luís e Amanda. Numa noite em que o restaurante é assaltado, Luís é seviciado. Adam intervém e leva um tiro. Alfredo prossegue sua viagem. Na Amazônia, defronta-se com o garimpo predatório e as imensas queimadas. Na selva, sofre um ferimento na perna. Maria Alice, no Rio, é submetida a outros assaltos e violência. O marido continua tirando proveito da bagunça típica do país, mas não consegue entender-se com trabalhadores como os motoristas de táxi, que dirigem a toda velocidade, desrespeitando todas as regras de sobrevivência no trânsito.

Na última cena, estão todos reunidos no restaurante, num jantar de despedida para Luís, que decidiu morar fora do país, por preferir uma violência "explícita e civilizada". Carlos está com a mandíbula fraturada, conseqüência de um acidente. Alfredo teve que amputar a perna. Adam ficou paralítico. Maria Alice tornou-se uma megera ressentida. Amanda é uma executiva de sucesso, proprietária de uma casa de adoção, fachada para o tráfico de órgãos de crianças para a Europa.

Fonte: Webcine

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segunda-feira, 6 de junho de 2011

III Seminário Margem Esquerda - István Mèszáros: o desafio do tempo histórico

De 18 de Agosto a 1 de Setembro de 2009, a revista Margem Esquerda e a Boitempo Editorial promoveram um intenso e extenso debate a respeito de um dos maiores intelectuais marxistas da atualidade: István Mèszáros. Disponibilizo abaixo os áudios de algumas das mesas onde a obra de Mèszáros é apresentada por ele mesmo e discutida por intelectuais brasileiros e latino-americanos.

A necessária reconstituição da dialética histórica -István Mészáros (precedido por um solo de Bach em viola, por Susie Mészáros)
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Educação e Socialismo -Afrânio Mendes Catani, Décio Saes, Isabel Rauber e Roberto Leher
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Marx, Lukács e os intelectuais revolucionários - Antonino Infranca, Emir Sader, Maria Orlanda Pinassi e Ricardo Musse
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Marxismo, lutas sociais e revolução na América Latina - Aldo Casas, Francisco de Oliveira, Gilmar Mauro e Lúcio Flávio de Almeida
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O Poder da Ideologia - Miguel Vedda, Osvaldo Coggiola, Virginia Fontes e Wolfgang Leo Maar
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Para além do capital – a crise estrutural do capital - Edimilson Costa, François Chesnais, Jorge Beinstein
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Para além do capital – lógica destrutiva e questão ambiental - Brett Clark, Carlos Walter Porto-Gonçalves, Mohamed Habbib e Plínio de Arruda Sampaio
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Trabalho e Alienação - Giovanni Alves, Jesus Ranieri, Ricardo Antunes e Ruy Braga
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