domingo, 30 de setembro de 2007

Ecos Falsos

Bandas novas para mim começam pelo nome. É compreensível. Imagine-se na minha pele. Estou aqui na internet, sem nada pra fazer, cansado de ver as mesmas fotos nos diferentes blogs pornôs, decido procurar coisas novas pra ouvir. E visito os mesmos blogs de sempre, que - diferentes do meu - são bem atualizados. Vejo aquela infinidade de bandas conhecidas e outras novas. Como não conheço o som das novas, escolho aquelas que vou conhecer pelo nome da banda. É claro. Frequentemente escolho os nomes que me causam um sorriso de canto de boca. Causou isso, entra na fila de downloads.
Foi assim com a "Ecos Falsos". Achei interessante, pelo seguinte: tudo bem que estamos nessa atual onda ambientalista, mas daí pensar que o nome da banda fosse uma crítica velada à alguns desses pseudoespecialistas que acreditam que dá pra reverter o aquecimento com medidas apenas paliativas era demais. "Ecos" não era diminutivo de ecologistas.
Descartada a imediata primeira hipótese, fiz o que qualquer mais espertinho faria. Apelei pro google. E olha só o que encontrei:

quatro paulistas que se acham a melhor boyband do mundo. Ecos Falsos = sinal de atividade alienígena (diz o Google), para quem acredita em alienígenas, claro. “Em vez de estar escrevendo isso, eu preferia estar produzindo um disco dos Ecos Falsos. Por quê? Porque quando eu fui ouví-los todo orgulhoso com a farinha da minha experiência, eles vieram com um bolo inesperado, e eu comi até mais do que queria. Esses profanos, esses agnósticos, esses heréticos são bons pra diabo!” (Tom Zé)

Depois disso, achei no site dos caras algumas opiniões. Seguem:

"A melhor coisa que eu ouvi de rock nos últimos tempos."
Tom Zé

"Ouvi outro dia limpando a casa, preciso ouvir de novo!"
Wander Wildner

"Ecos Falsos é uma banda que revela todo potencial da época atual."
Nando Reis

"Não conheço."
Lúcio Ribeiro, Folha de S. Paulo

"Bão dimais!"
Beto Cupertino, Violins

"De onde eu estava, não deu pra entender nada."
Clayton, Detetives

"Gostei muito daquela do cocô"
Gabriel, Autoramas

"Massa!"
Fabrício Nobre, MQN/Monstro Discos

"Rock honesto."
Gustavo Mini, Walverdes

"O som é bacana, mas vocês nunca vão fazer sucesso."
Clemente, dos Inocentes

"Sinto que vocês podem até ter um som legal cara, mas nunca irão fazer sucesso."
Carlito Frad87

"Tua banda tá mandando muito bem nos arranjos, tem três lá que são geniais!"
Bacalhau, Autoramas

"Rock de guitarras nervosas e letras protestatórias cantadas em bom português."
Humberto Finatti, Revista Dynamite

"Ah, legalzinho."
Phillippe Seabra, da Plebe Rude

"Bonita essa guitarra!"
Rodrigo Amarante, Los Hermanos

"Supercharged joyfully chaotic ska-surfpunk lofi classic!"
Steve Ison, Planet of Sound
sobre o single "eu nunca ganho"

"As músicas são boas, mas o vocal tá uma merda!"
Sérgio Dias, ex-Mutantes

"Banda com criatividade. Coisa rara hoje em dia."
Alexandre Cavalo, Velhas Virgens

Baixem logo o disco:

Descartável Vida Longa


Downloadeie este disco

domingo, 23 de setembro de 2007

Sambasonics

Nem só de rock viverá o homem, dizia Bezerra da Silva, embora esta afirmação nunca seja encontrada em nenhuma entrevista, em nenhuma conversa de bar. Mas acredito que ela poderia ser a ele atribuída sem risco de ser cometida nenhuma injustiça.


Agora, o que faz doi negões, um playboy, um rastafari e uma japa, quando se juntam pra comer um churrasco, beber cerveja e ouvir Chico Buarque? Fazem samba. Pra quem gosta, vale a pena conferir. Tem até uma versão rebolada "praquela" musica das velhas virgens "eu bebo sim".


Pra quem não gosta, deixe quieto e comece a ler este blog da postagem abaixo.


Abraços!
Sambasonics (2003)






Downloadeie este disco (corrigido)


Sapatos Bicolores

Para quem gosta de Graforréia, esta dica é interessante. Mais uma vez, três caras que fazem um som legal.

Vale a pena curtir.


Não sei se vocês estão percebendo, mas estou meio sem palavras ultimamente. Vou confessar que estou seguindo indicações do meu analista. Ele concluiu que esta história de blog está matando o musgo que era minha vida social. Além disso, ele percebeu minha frustração em tentar me comunicar com pessoas que não faziam a parte delas de serem interlocutoras. Então, me pediu para que eu tentasse, além do prozac, alguns momentos de mudez internética. Estou me esforçando, como vocês podem comprovar.
Grande abraço a todos.
Recomendações minhas aos seus!


Clube Quente dos Sapatos Bicolores



sábado, 22 de setembro de 2007

Terça Insana - Jackson Five, o motoboy

A cidde é uma ferida incrustrada na crosta terrestre"

Terça Insana - Eu Fico Puto!

"Prefiro ter um filho viado, que um filho velha"

domingo, 16 de setembro de 2007

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Entrevista do Raul para O Pasquim (1973)

Desta vez, vai uma entrevista do próprio. Ô, vamos combinar, o cara gostava de zoar os entrevistadores, né?
Vai lá um desafio: em quais momentos estava ele sendo sinceramente sincero?
Segue a prosa...

O PASQUIM - Você surgiu publicamente com Ouro de Tolo. Mas nós queremos que você conte o seu início, desde o princípio mesmo.
RAUL - Vamos ver. Vamos voltar a 1959. Eu tinha um conjunto de rock, lá em Salvador. Eu morava perto de uns garotos do consulado, eles me apresentaram uns discos de rock...

O PASQUIM - Qual consulado?
RAUL - O americano. Estava aquela coisa acontecendo nos Estados Unidos e nós tomamos conhecimento. Nós fizemos um conjunto de rock em Salvador, e a gente viajava pra todo interior, fazendo aquela coisa, assumindo mesmo, vivendo aquela coisa da época.

O PASQUIM - Como é que chamava o conjunto?
RAUL - Os Panteras. Porque todo conjunto daquela época tinha nome de bicho.

O PASQUIM - Era um conjunto de quantos?
RAUL - Eram quatro pessoas. Guitarra, baixo e Bateria.

O PASQUIM - Krig-Ha, onde fica?
RAUL - Krig-Ha seria um rótulo. É uma sociedade que existe hoje no mundo inteiro, com vários nomes. Aqui no Brasil nós batizamos com o nome de Krig-Ha, que é o grito de guerra do Tarzan. Você deve ter lido Tarzan, né? Khig-Ha significa "cuidado"!

O PASQUIM - Bandolo é inimigo, né?
RAUL - É. Aí vem o inimigo. Tinha o dicionário de Tarzan na primeira página. Você lia e tinha a tradução. Eu sabia aquilo decorado. Mas essa sociedade promove acontecimentos. O primeiro acontecimento que essa sociedade promoveu foi o disco, o LP Krig-Ha, Bandolo!

O PASQUIM - E aquele símbolo da sociedade? A chave?
RAUL - Aquele símbolo é o símbolo de Amon Ra, acrescido de uma chave. Esse símbolo tem uma história interessante. Quando o Paulo Coelho, meu parceiro, tava em Amsterdã, em 67, ele estava usando um símbolo hippie no pescoço. E veio um sujeito estranhíssimo e arrancou o símbolo do peito dele e colocou esse símbolo, sem a chave e disse: "Não é nada disso. Agora é isso." Ele ficou assustadíssimo com aquele símbolo no pescoço, mas começou a usar. E nós fomos uma vez, há pouco tempo, escrever uma peça, que nós vamos lançar para o ano. Fomos lá em Mato Grosso, numa tribo de índio. E numa barraquinha de índio tava vendendo esse mesmo símbolo. Uma coisa incrível e batizamos como o símbolo da sociedade.

O PASQUIM - Fale um pouco sobre a sociedade.
RAUL - Como eu estava dizendo, essa sociedade promove acontecimentos. O primeiro foi o LP. O segundo foi uma procissão que foi muito bem sucedida. Foi muito bonito. A gente levou uma bandeira na rua. Uma explosão. Porque vocês sabem que tem havido uma série de implosões. Nós saímos à rua, cantando, foi muito bonito. A terceira foi esse show de teatro, esse show que nós estamos fazendo agora. E a quarta vai ser o piquenique do papo. Nós vamos convidar todos os artistas, de todos os campos e vamos fazer um piquenique bem suburbano, no jardim botânico. Todo mundo. Pra conversar. Um rapaz já se prontificou a fazer um discurso sobre "A Maldade das Formigas."

O PASQUIM - Qual é o fim específico da sociedade? A que ela se propõe? Ela segue uma "filosofia"?
RAUL - Essa sociedade não surgiu imposta por nenhuma verdade, nenhum líder. Não houve liderança no mundo inteiro, como se fosse tomada de consciência de uma nova tática, de novos meios.

O PASQUIM - Da própria sociedade?
RAUL - É, do próprio mecanismo da coisa. Nós estamos correspondendo com pessoas que fazem parte dessa sociedade, inclusive Jonh Lenon e Yoko Ono. Eles fazem parte da mesma sociedade, só que com outro nome. Nós mantemos uma correspondência constante com eles.

O PASQUIM - Voltando à sua biografia. Você poderia explicar sua formação literária, como você chegou a esse texto?
RAUL - Isso aí é uma coisa interessante. Antes de eu vir pro Rio eu pensava em ser escritor. Eu sempre escrevi. Antes de cantar, eu pensei em escrever. Eu tenho alguma coisa escrita guardada no baú , que penso em publicar algum dia. Eu sou muito dado à filosofia, eu estudei muito filosofia, principalmente a metafísica, ontologia, essa coisa toda. Sempre gostei muito, me interessei. Minha infância foi formada por, vamos dizer, um pessimismo incrível, de Augusto dos Anjos, de Kafka, Schopenhauer. Depois eu fui canalizando e divergindo, captando as outras coisas, abrindo mais e aceitando as outras coisas. Estudei literatura, comecei a ver a coisa sem verdades absolutas. Sempre aberto, abrindo portas para as verdades individuais. Assim, sabe? E escrevia muita poesia. Vim pra cá publicar.

O PASQUIM - Você teve a intuição de que a música seria um veículo mais imediato de comunicação?
RAUL - Essa tomada de consciência que eu tive foi há pouco tempo, uns dois anos atrás. Porque eu usava a música por música. E por outro lado eu queria atingir uma coisa pela literatura. Mas eu vi que a literatura é uma coisa dificílima de fazer aqui, de comunicar tão rapidamente como a música. Eu tive uma escola muito importante, que foi a CBS como produtor de discos de Jerry Adriani, de Wanderléa, daquela coisa toda de iê-iê-iê. Eu produzia discos para o Trio Ternura , aquele pessoal. Foi uma vivência fantástica para mim. Aprendi muito a comunicar.

O PASQUIM - E o Paulo Coelho, teu parceiro?
RAUL - Eu conheci o Paulo na Barra da Tijuca, num dia que tava lá. Às cinco horas da tarde eu tava lá meditando. Paulo também tava meditando, mas eu não o conhecia. Foi o dia que nós vimos um disco voador.

O PASQUIM - Você pode falar nisso, já que tá na moda, todo mundo vendo disco voador de novo. Como é que foi isso?
RAUL - Foi depois do FIC, em que eu cantei o Let Me Sing.

O PASQUIM - Ano Passado.
RAUL - Cinco horas da tarde. Então eu vi. Enorme, rapaz, um negócio muito bonito. Inclusive os jornais levaram a coisa pro lado sensacionalista: O cara viu o disco voador. "O profeta do apocalipse." Eu dei muita risada com isso. Mas não foi nada, foi um disco muito bonito.

O PASQUIM - Dá pra descrever o disco?
RAUL - Dá sim. Foi... era meio assim... prateado. Mas não dava pra ver nitidamente o prateado porque tinha uma aura alaranjada, bem forte, em volta. Mas enorme, entre onde eu estava e o horizonte. Ele tava lá parado, enorme. O Paulo veio correndo, eu não conhecia ele, mas ele disse: "Cê tá vendo o que eu tô vendo?" A gente aí sentou e o disco sumiu num ziguezague incrível.

O PASQUIM - Durou quanto tempo mais ou menos?
RAUL - Uns dez minutos.

O PASQUIM - Qual foi o efeito disso em vocês?
RAUL - Ouro de Tolo, que pintou aí. Essa música.

O PASQUIM - Usaram muito esse disco pra dizer que você era místico, um negócio assim. Esse disco voador foi pra parada de sucesso.
RAUL - Falta do que dizer. Não se tem mais o que falar hoje. Tem que se falar mesmo neste lado de disco voador, profeta do apocalipse. O homem que viu o disco voador dá IBOPE, chamam ele pro Sílvio Santos.

O PASQUIM - Independente dessa sociedade, é claro, e das coisas em que você acredita, você não acha que o tipo de atitude que você toma publicamente influi nisso? O fato de colocar nas suas entrevistas que você viu um disco voador, o fato de você ter feito sua procissão e a entrevista que você deu à Manchete dentro do avião, no aterro...
RAUL - Aquela foi gozadíssima. Ela ligou lá pra casa e disse que queria fazer uma matéria comigo, eu disse: "Pois não, mas eu tenho que fazer uma viagem de avião. Eu só dou entrevista dentro do avião." Era aquele avião que tem lá no aterro. Aí nós fomos pro avião 4 horas da tarde. Ela já tava me esperando lá. E Paulo Coelho com a mala. Todos nós entramos no avião "Cê tá gostando da viagem?" Pusemos o cinto de segurança. E ela com um medo de fazer a entrevista, um medo horrível de mim. Aí surgiu a aeromoça, que era minha mulher, servindo sanduíche, cafezinho. Ela ficou apavoradíssima. Mas foi uma brincadeira que nós fizemos, para usar a imaginação.

O PASQUIM - Raul, os sinais, suas letras, está tudo ligado com um magicismo seu. Você brinca muito com isso não? Magicismo, ironia mágica, seja lá qual for. Pra botar isso bem curto: Qualé?
RAUL - Vamos citar o Apocalipse bíblico. Foi escrito numa época incrível, você tinha que falar uma linguagem simbólica, uma linguagem mágica. Mas o Apocalipse é uma coisa que se adapta a qualquer época.

O PASQUIM - Principalmente a atual. É, algumas épocas mais do que as outras, alguns lugares mais do que os outros.
RAUL - É quase a mesma linguagem que nós estamos usando pra tentar dizer, tentar chegar a um objetivo. Não é um objetivo de uma verdade absoluta, porque ninguém aqui quer chegar a uma verdade absoluta e impô-la. Apenas se quer abrir as portas. Para as verdades individuais.

O PASQUIM - Então você quer abrir uma porta na cabeça de quem tá te ouvindo. Não há uma hora em que se fecha de repente? O perigo de fazer essas coisas, o perigo do magicismo, da maneira de dizer as coisas...
RAUL - É uma escada.

O PASQUIM - Mas ao mesmo tempo há o perigo de você se fechar dentro do magicismo! Há esse perigo, você vê esse perigo?
RAUL - Não. É uma escada. Um estágio. Nós estamos no primeiro estágio. Estamos transando com a fase "Terra" da coisa. Esse primeiro estágio tem que ser assim. O segundo estágio é outra coisa, já é mais aberto. Não se pode começar uma coisa assim, você tem que manipular. Por exemplo, Raul Seixas. Eu tô segurando Raul Seixas ali embaixo, como uma marionete. Eu tô aqui em cima. Eu sei até que ponto ele deve subir um pouquinho mais, cada vez mais. Mas nunca ele pode chegar aonde eu estou, não vou comunicar mais.

O PASQUIM - Esse Raul Seixas que você manipula, que está lá embaixo, é em função de quem te escuta e te vê?
RAUL - Esse Raul Seixas que está no teatro Tereza Raquel, cantando esse tipo de música, dando um certo toque mágico na coisa, é necessário. Usando muito a imaginação, a intuição. Longe, fugindo do logicismo. Esse logicismo radical, kantiano, de Pascal. Eu vejo isso como um estágio.

O PASQUIM - Você faz isso mais para se entender ou pra que os outros te entendam?
RAUL - Pra que os outros me entendam. Pra que eu penetre em todas as estruturas, em todas as classes, em todas as faixas. Todo mundo tá cantando A Mosca na Sopa.

O PASQUIM - Eu acho que o magicismo seria uma entrelinha. Você não tem medo então de perder a linha? Você vai tanto na entrelinha que acaba perdendo a linha.
RAUL - Não, que é isso? Sabe por que? Eu tenho medo de hermetismo. Eu acho que não é mais fase de hermetismo.

O PASQUIM - Mas o magicismo pode cair.
RAUL - Mas é um magicismo estudado. É dosado, nêgo.

O PASQUIM - Se você não estiver muito sob controle, pode cair nisso. Isso exige um tremendo autocontrole, conhecimento de si próprio, senão você embarca no próprio som do que você está dizendo. Tem que saber o que você está fazendo.
RAUL - Eu tô fazendo.

O PASQUIM - É isso que preocupa, se você está consciente. Ô Raul, como é que você vê os seus contemporâneos no Brasil? Os que fazem outras coisas, que escrevem romances, fazem poesias, trabalham em jornal, televisão etc.
RAUL - Como eu vejo a realidade? Isso aí é fogo, rapaz.

O PASQUIM - Use o magicismo.
RAUL - Peraí. Eu vou falar uma coisa aqui. Eu vou falar sobre os cabeludos. Eu li outro dia um negócio de Pasolini na Veja. Vocês leram? Achei fantástico. Você já não sabe mais quem é quem. Tá aquela coisa de cabeludo, tá todo mundo estereotipado. Por isso é que eu faço questão de dizer que eu não sou da turma pop, que eu não tô comendo alpiste pop. Eu sei lá, eu acho que tá todo mundo de cabeça baixa, tá todo mundo schopenhauer, todo mundo num pessimismo incrível. Essa geração audiovisual, e digo isso muito maldosamente, eu chamo eles de "audiovisuaizinhos". Minha mulher fala comigo que eu não devo fazer isso com eles, porque a garotada tá sabendo. Tá todo mundo de cabeça baixa, quieto, conformado. Eu sou um cara muito otimista nesse ponto. Sei lá, eu não sei se é a minha correspondência com o planeta, vejo a coisa em termos globais. E tá realmente acontecendo uma coisa fantástica, que é essa certeza e conscientização de que você deve ser um rato, transar de rato pra entrar no buraco de rato, vestir gravata e paletó para ser amigo do rato. E depois as coisas acontecem. Não ficar de fora fazendo bobagem, de calça Levis com tachinha. Esse tipo de protesto eu acho a coisa mais imbecil do mundo, já não se usa mais. Eles tão pensando como Jonh Lenon disse, "they think they're so classless and free". Mas não são coisa nenhuma, rapaz, tá todo mundo dentro de uma engrenagem sem controle.

O PASQUIM - Vamos falar do tempo em que você era produtor de discos na CBS. A sua posição profissional era praticamente ditatorial. Como é que era a tua transa pessoal com essa gente?
RAUL - Eu fazia aquela coisa porque sabia que era uma coisa inconseqüente. Eu fazendo ou não, outra pessoa ia fazer. Eu estava fazendo aquele trabalho, o diretor da CBS queria, e enquanto isso ia aprendendo a usar aquele mecanismo.

O PASQUIM - Você estava de rato?
RAUL - Exatamente. Eu estava de rato, vestido de rato. Foi quando surgiu a idéia de eu contratar Sérgio Sampaio e Edith Cooper, que é uma boneca lá da Bahia, um cara fantástico, muito amigo meu. Nós fizemos um disco chamado Sociedade da Grã Ordem Kavernista Apresenta: Sessão das Dez. Mas o disco foi misteriosamente tirado do mercado porque não era a linha da CBS. Esse disco foi quando eu botei as manguinhas de fora, foi quando eu comecei a fazer o trabalho. Era um disco que mostrava o panorama atual, o que tava acontecendo, o caos todo daquela época. O caosinho bonitinho que tava acontecendo naquela época.

O PASQUIM - Aí você foi expulso da CBS.
RAUL - Fui expulso em função desse LP. E também porque fui no festival Internacional da Canção, cantar Let Me Sing.

O PASQUIM - Eles não queriam isso?
RAUL - Não. Eles disseram: "Ou você é produtor ou você é cantor." Eu tinha que optar.

O PASQUIM - Raul o que te levou ao hermetismo? O que você andou fazendo de coisas herméticas, e o que te deu a noção de equilíbrio?
RAUL - Foi o primeiro LP que gravei na Odeon. Foi um LP louco, rapaz. Um LP extremamente filosófico, metafísico, ontológico, que falavam em sete xícaras, ou seja, as sete perguntas aristotélicas. Ou seja, as fontes do conhecimento.

O PASQUIM - Como é que chamava o disco ?
RAUL - Raulzito e seus Panteras.

O PASQUIM - Raul, você tem filhos?
RAUL - Tenho uma filha.

O PASQUIM - Em 59, você fazia rock na Bahia. Você conheceu Caetano e Gil na Bahia?
RAUL - Conheci o Gil.

O PASQUIM - Isso foi antes do tempo de Gessy-Lever?
RAUL - Do tempo que eu fazia jingle também. Só que eu fazia jingle rock e ele fazia jingle bossa-nova. A gente se conhecia, 59, 60 por aí.

O PASQUIM - Depois desse contato, como é que foi ficando? Distante?
RAUL - Era uma coisa lá e outra aqui. Nós tínhamos um lugar, o cinema Roma, onde a gente promovia shows de rock.

O PASQUIM - Bossa-nova não?
RAUL - Bossa-nova era no teatro Vila Velha. Era uma coisa bem separada mesmo. Existia um conjunto lá, a Orquestra de Carlito, com Caetano e Gil. E existiam os Panteras. Duas coisas completamente diversas. Mas no fundo eu acho que estava todo mundo querendo chegar a mesma coisa, era só problema de linguagem.

O PASQUIM - Raul, o pessoal que viu o show em São Paulo diz que, além da crítica leve que você fez ao Roberto Carlos, tinha uma crítica ao Caetano também.
RAUL - Tinha não.

O PASQUIM - E a crítica ao Roberto?
RAUL - É uma brincadeira. Porque quando Ouro de Tolo saiu, tava saindo uma música do Roberto em que ele agradece ao Senhor pelas coisas recebidas. Ele disse que agradece, eu digo que eu devia agradecer. Foi isso que os caras pescaram.

O PASQUIM - Você está a fim de ocupar a vaga de guru que o Caetano Veloso deixou?
RAUL - Eu não sei se é isso, não. Acho que Caetano tá sabendo o que tá fazendo. Ele sabe exatamente.

O PASQUIM - Caetano era guru ou não era?
RAUL - Não... Eu acho que ele não assumiu esse negócio de guru. Eu acho que viram ele como uma tábua de salvação, as pessoas tavam precisando dele, tava na hora de um apoio. Então escolheram o Caetano.

O PASQUIM - Ele ainda é o líder?
RAUL - O que você acha?

O PASQUIM - Eu acho que é. E você o que acha?
RAUL - Eu acho que tanto Caetano como Gil, embora sendo trabalhos diferentes, são incríveis.

O PASQUIM - Você falou sobre Caetano e Gil, falou sobre Jonh Lennon. E a sua influência do Bob Dylan?
RAUL - Isso é engraçado, todo mundo fala sobre esse negócio do Bob Dylan. Eu gosto de Dylan, mas não foi uma coisa marcante.

O PASQUIM - Ouro de Tolo tem uma influência.
RAUL - A letra de Ouro de Tolo saiu antes da música. Veio a letra primeiro. Eu só podia dizer aquela monstruosidade de letra quase só falando. Então calhou. Aquela coisa de Dylan, falada, calhou.

O PASQUIM - No ato de compor, o que vem primeiro na maioria dos casos, a letra ou a música?
RAUL - Geralmente vêm juntas.

O PASQUIM - Seu espetáculo é a aplaudido com um entusiasmo, digamos assim, com uma zorra total no teatro. Isso pode ser a força de seu recado. Um recado tão forte que o pessoal quer aplaudir, mas o recado ainda está um pouco na frente do momento. O que você acha?
RAUL - Eu não vou dizer por mim, mas Paulo Coelho acha isso. Ele acha que as pessoas ainda estão em dúvida, estão com um certo receio, assustam um pouco.

O PASQUIM - Raul, você falou sobre a sociedade. E outros planos para o futuro?
RAUL - Eu já tô com o meu segundo LP na cabeça. É como um degrau. Eu dividi o trabalho em quatro fases, simbólicas, é claro, dentro daquilo que nós já falamos, de magicismo. Fase Terra, Fase Fogo, Fase Água e Fase Ar. Somente com a identificação. Essa fase fogo vai ser diferente dessa, dentro do mesmo tipo de música, mas não exatamente iê-iê-iê. É outra coisa, eu prefiro que seja surpresa. Vejam depois de pronto. Eu tô seguindo uma orientação geral, em que eu recebo e dou informações. Em todos os quatro cantos do mundo, a gente tá sempre recebendo, tá tendo informações. Essa outra fase é uma fase de escada mesmo. Um lugar que você vai chegando gradativamente, sabendo aos poucos.

O PASQUIM - Basicamente que público você atinge?
RAUL - Todas as classes. Isso é que é bom. Sabe por quê? Eles assimilaram Ouro de Tolo dentro de níveis diferentes, mas no fundo era a mesma coisa. O intelectual recebia de uma maneira, o operário de outra. Lá em casa tá acontecendo uma coisa muito engraçada. Atrás do edifício estão construindo um outro enorme, então os operários cantam o dia inteiro Ouro de Tolo, com versos que eles adaptam para a realidade deles. Eles transformam os versos, dizem: "Eu devia estar feliz por que eu ganho vinte cruzeiros por dia e o engenheiro desgraçado aí..." Eu ouço o dia inteiro eles cantando isso aí. E as cartas que eu recebi da revista POP, que fez uma transação aí, negócio de "Diga o que você acha da música Ouro de Tolo." Veio do Brasil inteiro. Fantásticas aquelas cartas, eu guardo um monte. Eu li essas cartas todas. Todo mundo entendeu, dentro de uma conotação própria, dentro de um nível diferente. Eu achei fantástico isso. Quer dizer que tá funcionando.

O PASQUIM - Você tem algo a declarar para as novas gerações?
RAUL - Não, é uma juventude sadia, alegre, satisfeita, feliz e contente. Comendo alpiste. Amém.

Entrevistas sobre Raul 2

Kika Seixas, a única ex-mulher de Raul Seixas que mantém ligação direta com a obra do artista, revelou em entrevista feita em sua casa, no Rio, detalhes da vida a dois nesse casamento que durou cinco anos.
Apontada por alguns inimigos como "aproveitadora" do legado do ex-marido, dá de ombros. Defende seu trabalho como fundamental para que a imagem de Raul se mantenha viva.
Kika conheceu Raul com 27 anos, quando, segundo ela mesma, era "linda e maravilhosa" e mantinha um relacionamento com o então chefão da Warner no Brasil, André Midani. Largou-o por Raul, com quem acabou tendo uma filha, Vivian, hoje com 18 anos. Passados cinco anos, deixou-o também: "Ele começou a cheirar éter, aí foi demais". Atualmente casada com João Carlos de Paranaguá, produtor, com quem mantém excelente relacionamento, Kika não esqueceu de Raul. "Ele foi e sempre continuará sendo importante para mim. Até por isso continuarei trabalhando pela sua obra."

A ingenuidade
"Ele vivia 24 horas o artista Raul Seixas. Não tinha um distanciamento, o que até criava problemas. Dormia e acordava de botas e óculos escuros. Essa ingenuidade era um negócio muito genuíno dele, talvez até um pouco demais da conta. Os artistas atuais têm um distanciamento maior, acho que foi aí que ele se perdeu..."

A Sociedade Alternativa
"Gozado, não sei se o Raul tinha dimensão do que era isso. Ele era apolítico, então, sinceramente, não sei o que pretendia com isso, acho que era só um sonho. Até hoje, pessoas me perguntam isso, o que é a Cidade das Estrelas, se ela existiu. Acho que a Sociedade Alternativa ficou sendo mais uma pessoa, mais um ponto de vista do público dele do que dele mesmo. Eu me lembro que uma vez magoei muito o Raul, quando disse: 'Isso aí é um papo completamente impossível, que Sociedade Alternativa é essa, cara? Como é que você quer criar algo, em que bases, o que é isso, que palhaçada é essa? Sociedade Alternativa porra nenhuma, você não é capaz de gerir a sua própria vida, a sua família'. Ele ficou arrasado naquele dia, deprimido."

Últimos momentos
"Ele morreu cheirando e bebendo. No último fim de semana tinha cheirado e bebido e, como nos finais de semana a empregada não ficava em casa, e era ela quem o pressionava para tomar as injeções de insulina, não resistiu. Cara, o Raul detestava aquelas injeções de insulina. Não há nada menos rock'n'roll que o cara ter de se medicar, entendeu? Raul detestava isso e a empregada, a Dalva, enchia tanto o saco dele que ele acabava se aplicando. Foi opção dele, entendeu? Inclusive o Marcelo Nova, no final, montou um esquema de segurança para proteger o Raul e ele detestava aquilo. Dizia: 'Poxa, você viu os seguranças, os trogloditas que estão lá fora, uns caras agressivos pra caramba!' Mas era tudo para não deixar ninguém chegar perto do Raul e dar cocaína ou bebida pra ele, mas ele ficava arrasado. Era aquilo que ele queria. O fim da vida de Raul foi uma tragédia. Raul estava feio, gordo, não tomava mais banho, não andava, se arrastava, não cantava mais, estava sem dentes. Olha, no final da vida, na intimidade, eu vou te contar, ele me chamava para dormir e eu ia lá, o Raul fazia xixi nas calças, o álcool já tinha consumido tudo. Ele não comia, era uma tragédia, eu olhava para a vida de Raul e, de certa forma, dei graças a Deus por ele ter morrido, eu não sei o que seria a vida dele se estivesse vivo."

O público e a imprensa
"Quando faço o Baú do Raul (show promovido por ela) é óbvio e lógico que vem um monte de coroas e tal, mas quem mais vem é a garotada. E ainda tem um pessoal que 'recebe' uns santos e diz que eu estou incomodando a alma do Raul. Que ele precisa descansar, que preciso parar de fazer shows etc. agora mesmo me mandaram um livro que fala do roqueiro do além. É um escândalo, bicho. O cara não diz que é o Raul, mas dá a entender que é o Raul. Mas não é, porra nenhuma, não tem Raul nenhum ali, é uma coisa estranhíssima. O tal do roqueiro do além não tem nada a ver com o Raul. O verdadeiro Raul tá adorando tudo isso que a gente faz... Quem criou o mito foi o público, o povo. Eles que trouxeram o Raul de volta, porque os jornalistas, a mídia, estava meio assim porque ele tinha criado uma tarja de inconseqüente, alcoólatra, viciado, irresponsável e, quando ele morreu, a mídia preferiu ignorá-lo, como já vinha fazendo no fim da vida dele e, mesmo assim, vendia as 100.000 cópias dele. Mas eles tiveram de dar a mão à palmatória até porque no enterro, na Bahia, eram 5.000 pessoas, uma loucura. Uma hora o caixão fugiu, foi indo embora e aí dona Maria Eugênia falou: 'Deixe, deixe que levem o meu filho, eles que enterrem meu filho'. Quando fomos ver, o caixão já estava duzentos metros à frente, sendo enterrado pelo povo, pelo público dele. Em São Paulo, foi a mesma coisa. O público só deixou o funeral sair quando veio o corpo de bombeiros.

Encontro com John Lennon
"Essas histórias são fantasias, fantasias."

Sempre ligado
"Ele sempre bebeu. Dizia que desde os doze anos tomava uns porres em um lugar chamado Cantinho da Música. Ele sempre teve muita dificuldade de conviver com a realidade, ficava sempre deprimido, tomava Diempax e outras bolas. A realidade para ele era demais, demais mesmo. Ele também deixava todas as luzes da casa acesas porque tinha horror a dormir. Estava sempre ligado, bicho. Achava perda de tempo dormir. Dormia demais quando estava deprimido, podia passar o dia inteiro dormindo, entendeu? Mas dormia pouco. Tipo, quando dormia à meia-noite, às 4 da manhã estava feliz da vida, acordado. Aí, pegava a Vivian e trazia para eu dar de mamar. Estava sempre acordado."

A relação com Paulo Coelho
"Eu vivi seis anos com o Raul, ele sentia falta, digamos assim, daquele período de criatividade intensa, o Paulo é um homem inteligente, mas o Raul fez questão de criar um distanciamento mesmo do Paulo, eu não sei por que e também não gosto muito de falar sobre isso, acho que isso acaba virando fofoca."

As drogas
"Ninguém consegue viver com o álcool e as drogas o dia inteiro e depois, à noite, ir fazer show ou gravar um disco. Quando ele ia gravar, às vezes ficávamos um mês no estúdio. Ele se trancafiava cheirando cocaína durante cinco dias seguidos e no sexto, sétimo dia ia para o estúdio. Qual é o ser humano que consegue isso? E o fato é que realmente saíam obras-primas, saiu Gita, Aluga-se, saíram todas, mas no sétimo dia, bicho, alguma coisa ia ficar ruim, ou o pâncreas dele ia pras cucuias, como foi. Mas tudo por conta da arte, nunca vi o Raul cheirando ou bebendo para bater um papinho ou ficar doidão, não, o negócio era compor que nem um louco..."

O Rock das 'Aranha'
"Estávamos em Miguel Pereira com o Cláudio Roberto (um dos mais importantes parceiros de Raul). Estava, ele, a Ângela, mulher de Cláudio, e nós. Fomos passar o fim de semana com eles, coisa de amigo mesmo. Mas bastava se encontrarem que os caras compunham. Nesse final de semana, eles fizeram Ângela, obra-prima, para mim e para a Ângela, porque eram duas Ângelas. Fomos dormir e no dia seguinte, quando eu e Ângela acordamos, tinha o Rock das 'Aranha' pronto. A Ângela, caretérrima, achou um horror a música. Eu de cara achei genial. Foi assim a história."

O lado machão
"O Raul tinha horror a lésbica, tinha horror a viado, nesse sentido era a pessoa mais careta que eu vi na vida. Boiola não podia nem chegar perto, o Raul ficava incomodado, saía da sala, ficava piscando, fazendo trejeitos. Por isso digo que o Rock das 'Aranha' foi pura sacanagem, só. Por isso, essa fofoca que rolou por conta de o Paulo Coelho ter dito que tentou transar com um outro homem duas vezes não tem nada com o Raul. Isso é sacanagem. É foda, cara: até o João, meu marido, me acordou quando saiu essa matéria, dizendo: 'Kika, o Raul era viado, tá escrito'. Eu disse: 'Não fala bobeira, João. Ele era porreta'. 'É viado, é viado, tá escrito aqui!', ele insistiu. Mas eu garanto, não foi com ele que o Paulo teve essa relação."

A dependência química
"Ele acordava cedo, ia para o bar e tomava vodca com Coca-Cola. Isso às 9 horas da manhã, ficava um pouco no bar, e quando dava 11 horas voltava para casa, tomava o café tradicional, depois ia para o bar novamente beliscar uma língua ou carne assada. Voltava ao meio-dia, ouvia som e caía duro na cama. À tarde precisava de alguma coisa na agenda para fazer, para preencher o dia, senão descambava, mas para levantar tinha de ter o combustível."

As parcerias
"Eu não sou burra, bicho, sou uma mulher inteligente. De repente, o Raul dizia 'vamos compor' e eu topava. Ele dava uma palavra, eu outra, e aí rolava a frase. Mas, muitas vezes deixei de botar o meu nome em parcerias porque achava que ficaria ruim para o Raul ter mais de uma parceria, deixei de ganhar dinheiro. Se tivesse colocado, hoje teria direito aos direitos autorais. Achei que ficaria melhor para a imagem dele. Aluga-se é minha, Abre-te Sésamo é minha, Só pra Variar é minha; eu estava lá nesses momentos. Mas achava que não devia deixar o público saber que foi feito por outra pessoa, mais uma mulher, mais um parceiro. Achava que tinha de preservar o Raul, bicho... eu amo o Raul. Ele até me falava: 'Kika, a gente tá deixando de ganhar dinheiro. Se você diz que a música é só minha e de outro cara, a gente ganha metade e metade. Se você disser que a música é de Raul, Kika e o outro, vai ficar um terço pra cada um'."

Os direitos autorais
"Hoje ele rende U$ 120.000,00, cara, 120.000 dólares para as herdeiras por ano. Quando peguei para tocar, elas só recebiam 50.000 dólares, por isso acho que ajudei bastante. O Raul é a terceira maior execução do Brasil. Desde botecos até os shows. É, bicho, depois que comecei a assumir esse trabalho gratuito, de gerenciar o trabalho do Raul, as coisas começaram a ser pagas direitinho. E isso não reverte nada para a minha firma, nenhum tostão, só a minha filha que recebe. E eu quero receber, sim, 5, 10 ou 15 porcento como agenciadora disso. As outras filhas dele não sabem nada do que acontece, os advogados delas não sabem nada, só recebem. Só recolhem o que é depositado. Por isso vou entrar na Justiça pedindo o que é meu de direito. Isso só acontece porque as herdeiras não estão sabendo o que está ocorrendo, porque os advogados não têm interesse de passar para elas que existe uma pessoa que trabalha e que vive Raul, e que trabalha para o nome Raul, senão a percentagem deles ia ser provavelmente diminuída. Se tem uma pessoa que realmente trabalha Raul Seixas, divulga, então por que os advogados ganham 9 porcento? Como eles não querem diminuir essa soma, então fui para a Justiça, estou botando todo mundo na Justiça, inclusive minha filha."

Material inédito
"Sim, tenho, sem dúvida, porque compro coisas quando sei que são inéditas, porque quero deixar coisas para a minha filha poder ter algum retorno no futuro. Por isso não fiz um CD-ROM nem um filme. Estou guardando isso para a Vivi (Vivian)."

Frágil e forte
"Ele era extremamente frágil, de um lado, e corajoso, do outro. Ficou quatro meses entubado no hospital Albert Einstein e nunca vi esse homem reclamar. Nem dar um ai. Ele não comia, só tomava injeção. Quatro meses deitado numa cama. É isso que eu digo, nessas horas ele era uma força gigantesca. Passou dois anos sem gravar e nunca vi Raul dizendo: 'que merda a minha vida'. Ele foi uma fortaleza até mesmo no final da vida. Mesmo do jeito que ele estava teve coragem de tentar me seduzir. Precisa ser muito homem pra fazer isso na situação em que ele já se encontrava."

Entrevistas sobre Raul Seixas

Encontrei uma entrevista sobre Raul Seixas dada por sua mãe à revista Caros Amigos em 1999. Depois, tem uma espécie de relato temático dado pela Kika há algum tempo atrás. Interessante é notar as diferenças de percepções das duas sobre a figura do Raul.

Segue lá o primeiro relato.

Caros Amigos - Como era o Raul na infância, em Salvador?
D. Maria Eugênia - Raulzito sempre foi um menino muito inteligente e travesso. Ele usava o irmão mais moço, o Plínio, para as artes dele. Tinha mania de pegar os cadernos do colégio e fazer histórias e desenhos e depois os vendia ao irmão. Isso só pela farra, pela brincadeira, porque não ligava para dinheiro. Ficou três anos na 1ª série. Perdia o ano de tanto que faltava. Fugia do colégio e ia para uma casa que chamava Cantinho da Música para ouvir Elvis Presley. Raulzito também era muito amoroso e apegado à família. Adorava o irmão.

Caros Amigos - Ele sempre teve alguma relação com a música?
D. Maria Eugênia - Sempre. Naquele tempo ele tinha um gravador de fitas de rolo e gostava muito de ouvir baião e música cubana. Dizia que baião era igual ao ritmo de Elvis Presley. Dizia que Luís Gonzaga e Elvis Presley eram muito iguais. Desde pequeno falava que um dia iria colocar sua mão no cimento, entre os artistas de Hollywood, na Calçada da Fama. Com doze ou treze anos já fazia shows no interior da Bahia. Ia de ônibus comum, ele mais os irmãos Thildo Gama e Décio. Cantavam também em um programa de calouro lá em Salvador, mas o apresentador meteu o gongo neles.

Caros Amigos - Como a senhora reagiu ao perceber que seu filho seria um artista?
D. Maria Eugênia - Era totalmente contra, Ave Maria! Meu Deus! Quem é que queria que um filho fosse artista? Naquela época, artista não tinha o menor valor. Eram boêmios e boas-vidas. Batalhei um bocado para que ele não fosse artista, eu e o pai, Raul Varella Seixas. Queria que ele fosse diplomata. Raul tinha muito jeito para isso, pois era educado, delicado, sabia falar inglês. Daria um diplomata de primeira. O consulado americano era perto de casa e ele não saía de lá, conviveu com americanos direto, a vida toda. Tinha paixão por eles. Cheguei até a mandar falar com o Itamarati, mas ele não aceitava, não. Dava bem mesmo, cantando Maluco Beleza (risos).

Caros Amigos - Mas o pai tinha uma ligação com a música, não?
D. Maria Eugênia - Tinha, gravou duas ou três músicas. Também lançou um livro de poesias e contos. Tocava acordeão em casa, mas não pensava em ser artista.

Caros Amigos - Eles tocavam juntos?
D. MAria Eugênia - Tocavam, cantavam... tenho fitas gravadas com os dois tocando e cantando juntos. Raulzito também gravou três músicas do pai, minha Viola, Lá Vai o Meu Sol e tem outra, não sei o que lá do meu coração (Coração Partido), ando muito esquecida. O Raulzito era muito inteligente, as músicas que ele fazia dava como parceria aos amigos ou mulheres com quem vivia na ocasião. Fazia isso por causa do Imposto de Renda. Inclusive o Paulo Coelho, que só dava umas pinceladas nas músicas e hoje se diz autor de muitas. É conversa fiada. Não gosto de falar o nome dele, eu tenho minhas queixas e mágoas. Paulo Coelho enganou Raulzito desde essa época.

Caros Amigos - Como assim?
D. Maria Eugênia - Paulo e a mulher dele faziam panfletos contra os militares e aproveitavam os shows de Raul para distribuir. Meu filho precisou ir correndo da casa dele para a casa de minha irmã Maria Angélica para se esconder de madrugada porque a Polícia Federal estava atrás dele. Em uma ocasião, Raulzito chegou com as costas todas marcadas, sujas de sangue. Eu não deixei ninguém ver meu filho assim, não. Falei para ele entrar no banheiro e ficar de cueca e lavei suas costas e coloquei remédio. Mas ele diz que não poderia demorar muito, porque tinha de se vestir e viajar. Paulo Coelho foi quem buscou Raulzito para levar ao aeroporto, pois os militares mandaram ele para fora, com o visto de ida sem volta. Raul passou um ano nos Estados Unidos. O pai de Edith, sua primeira mulher, colocou um detetive para procurá-lo, ninguém sabia onde estava, porque não tinha permissão de se comunicar com o Brasil, os militares eram fogo. Depois Gita estourou. Fez um sucesso danado. Gita foi que trouxe ele de volta. Os militares não tiveram jeito, tiveram que mandar buscá-lo.

Caros Amigos - O que a senhora destacaria além da inteligência de Raul?
D. Maria Eugênia - Era muita amoroso, não ligava para preto, branco, pobre, rico, abraçava todo mundo, beijava todo mundo, mesmo antes da fama. Uma ocasião, eu vi Raul fazer uma coisa que Kika (último casamento do Raul) ficou chateada. Eu, Kika, Raul e o empresário estávamos saindo de um show pelos fundos do Teatro Pixinguinha, estava um frio danado, Raul viu um velho dormindo no chão, todo lascado, tirou o casaco dele e cobriu o velho. Kika disse: "Mas você vai dar o casaco de visom para ele?" Era um casaco cor-de-rosa que ela havia comprado para Raulzito nos EUA. Ele respondeu que aquele velho precisava mais do que ele e que depois comprava outro.

Caros Amigos - Ele era sempre assim?
D. Maria Eugênia - Toda a vida. Não tinha apego a dinheiro e às coisas materiais. Raulzito não levava um tostão no bolso, e eu dizia: "Mas, meu filho, você vai sair sem dinheiro?" E ele perguntava: "Pra que eu quero dinheiro? Pagam tudo para mim, não preciso de dinheiro, não". As mulheres dele é que administravam as contas do banco. E doutor Hélio, que era advogado dele, comprava ações na bolsa tanto de São Paulo como do Rio.

Caros Amigos - Como era a sua relação com ele? Ele ligava sempre para a senhora?
D. Maria Eugênia - Ele sempre ligava para mim mesmo de madrugada e dizia: "Minha mãe, acabei de fazer um show, amanhã de manhã eu estou aí, mas não fico em Salvador, não. Vou para a chácara, não quero jornalista junto de mim".

Caros Amigos - A senhora se lembra de alguma música que tenha referências da infância e adolescência do Raul? Parece que O Trem das Sete realmente fez parte da vida do Raul.
D. Maria Eugênia - É verdade. Tínhamos uma casa de veraneio em Dias D'Ávila, a uns 60 quilômetros de Salvador. Naquele tempo, a estrada de rodagem era péssima, de barro. Meu marido era engenheiro da estrada de ferro da Rede Ferroviária Federal e costumávamos ir de Salvador para aquele lugarejo de trem, e era o trem das 7, que se chamava "Pirulito". É a saudade do trem das 7.

Caros Amigos - Tem mais alguma música que tenha relação com a infância ou adolescência de Raul?
D. Maria Eugênia - A Menina de Amaralina, mas essa ele não gostava nem de cantar. Dizia que era uma porcaria. Foi uma música que ele fez para a namorada, a Edith, que morava em Amaralina.

Caros Amigos - É verdade que ele teve uma briga com o Sílvio Santos?
D. Maria Eugênia - É, sim. Ele foi ao programa do Sílvio Santos e, quando chegou lá, abriu a capa, feita por Edith, e botou o peito nu para fora. Quando chegou no camarim, o Sílvio deu a maior bronca, dizia que era imoral ele botar o peito de fora. Aí começaram a discutir e foram aos tapas... Bem onde, hein? Porque hoje esse programa mostra tanta porcaria e mulher nua.

Caros Amigos - E quanto à relação dele com o álcool e as drogas, como a senhora reagiu e de que forma tomou conhecimento disso?
D. Maria Eugênia - Me chocou demais. Raul ligou para eu ir ao Rio de Janeiro, disse que Kika tinha sofrido um aborto e que eu precisava ficar com ela. Mas quando chegávamos do aeroporto já tinha três ou quatro homens esperando para prendê-lo. Eu perguntei por que, e a empregada dele, que eu tinha trazido de Salvador, contou que Raulzito estava metido com drogas. Depois ele começou com o álcool. Largou a droga toda e passou a beber, tirou parte do pâncreas e morreu alcoólatra. Precisei procurar um psiquiatra em Salvador, porque foi uma barra pesada o que passei. Com tudo isso, acabei ficando muito doente, muito nervosa, não dormia mais. Cansei de dar socorro, as mulheres dele me ligavam quando ele estava no auge do álcool ou da cocaína. Precisei sair de Salvador e interná-lo umas dez ou quinze vezes. Em uma ocasião, ele deu para cheirar éter e ficava doido. Ele estava casado com Kika. Nessa época, moravam no Itaim, em São Paulo, foi horrível. Ela me telefonou e disse que a situação estava péssima. Até o gato da vizinha não se agüentava em pé, o gato estava viciado.

Caros Amigos - E como ele reagia a cada internação?
D. Maria Eugênia - Muitas vezes ele nem sabia do que se tratava. Estava lá com a cabeça para outro lado... Em uma ocasião, ele fez uma comigo que foi horrível. Não queria ir de jeito nenhum ao hospital, mas o médico disse que primeiro ele tinha de tomar soro e glicose para diminuir o éter. Nisso, deu uma injeção nele disfarçada para ficar meio mole e inventou que eu estava passando mal. Precisei sair do médico de maca. E só assim ele foi ao hospital, agarrado na minha mão, com medo que eu tivesse alguma coisa. Em outra situação, Raul pegou a chave do apartamento e escondeu dentro da meia. Depois que o deixei na clínica, cadê a chave? Nada da chave, e acabei sendo hospedada pelo vizinha.

Caros Amigos - A senhora consegue identificar o momento em que a situação ficou incontrolável?
D. Maria Eugênia - Em São Paulo a coisa foi pior. Ele se achava no auge e quanto mais ele subia, mais ele bebia, mais tomava droga. Mas o psiquiatra de Salvador dizia que ele se jogou ao álcool e às drogas por trauma, paixão, porque deixou Edith. Raul a amava muito. Quando o negócio da repressão estourou e precisou ir embora, largou ela por outra, a Gloria, que vive nos Estados Unidos. Mas, além de abusar das drogas e das bebidas, ele era diabético desde os trinta anos e tinha horror a tomar insulina.

Caros Amigos - Tinha que tomar insulina sempre?
D. Maria Eugênia - Muitas vezes não tomava, dizem que ele morreu de madrugada por isso. Dalva, que era a secretária dele, contou que Raulzito não estava passando bem, dormia muito. Ele entrava em coma diabético direto, por causa da falta de insulina. Tomava da mais forte, porque a diabete dele era muito alta. A secretária avisou-me que chamou um médico, mas que era necessário fazer alguns exames na segunda feira. Porém, Raulzito falou que não ia e que queria ver a Kika. Nisso, Dalva foi embora para passar o fim de semana em sua casa e na segunda-feira, dia 21 de agosto, esperou até umas 9, 10 horas da manhã, viu que Raulzito estava demorando a se levantar, pois geralmente acordava cedo. Ela disse que abriu a porta, espiou, e ele estava deitado com o peito de fora, muito pálido. Entrou na ponta do pé e fechou a janela, ele já estava morto, mas ela não viu, fechou a janela, telefonou para o Marcelo Nova, ele não estava. Aí telefonou para o Jerry Adriani, mas o pai dele tinha morrido havia poucos dias e ela não achou o Jerry. Então telefonou para José Roberto Abrahão, um advogado muito amigo dele, que participou do disco A Pedra do Gênesis, e ele disse que ia, mas ia levando o médico. Quando o médico chegou, disse que Raul já tinha morrido, no meio da madrugada.

Caros Amigos - E como a senhora ficou sabendo?
D. Maria Eugênia - Dalva ligou para o doutor Hélio, que avisou meu filho, Plínio, que foi lá em casa com uma amiga minha, e também já tinha chamado o psiquiatra. Me deram uma injeção, colocaram-me para dormir e perguntaram se eu queria que ele fosse enterrado em São Paulo. Mas não quis, não. Disse que queria ver meu filho mesmo morto. Ele está sepultado no Jardim da Saudade, em Salvador, uma sepultura só dele, roubaram cinco lápides, foi preciso mandar pregar uma de cimento.

Caros Amigos - Dizem que no dia do enterro, em Salvador, o povo começou a levar o caixão. Como foi isso?
D. Maria Eugênia - Pelo amor de Deus! Um tumulto tão grande, quase jogam Plininho e minha neta dentro da sepultura, uma coisa horrível. Empurraram eles, todo mundo querendo pegar o caixão; eu não terminei de assistir à missa de corpo presente, meu marido já estava doente; começaram a dar murros na tampa, queriam abrir o caixão, já na hora de enterrar. Foi um horror, tinha mais de 5.000 ou 6.000 pessoas no enterro.

Caros Amigos - Seu filho virou um mito, como é isso para a senhora?
D. Maria Eugênia - É, um deus, não me largam. Pessoas do Brasil inteiro telefonam e escrevem para mim. É de Goiás, Brasília, Rio Grande do Sul, Rondônia, nem sabia que existia Rondônia, no meu tempo não havia, não. O pior é quando me ligam de madrugada, a cobrar, já pensou? Lá dos infernos, que eu não sei nem de onde estão me ligando. Eu digo: "Meu filho, eu estava dormindo, que é que você quer?" "Ah!, eu queria saber se Raulzito fazia isso ou aquilo." Eu digo: "Deixe pra amanhã, até logo". Acho que é um pessoal que está se divertindo na noite, conversando sobre Raulzito.

Caros Amigos - O Raul, além de ser um artista, um músico, mostrou uma nova proposta de vida às pessoas, por exemplo, com a música Sociedade Alternativa. Como a senhora avalia isso?
D. Maria Eugênia - Aliás, muita coisa que o Raulzito falou está acontecendo, esse negócio de aluga-se o Brasil é uma realidade. Muitas outras coisas que vemos hoje em dia ele já havia dito em suas músicas. Era meio profético, e muito inteligente.

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Bem vindos ao Teatro Mágico

Essa galera aí de cima é a trupe toda reunida d"O Teatro Mágico". Eles fazem uma espécie de sarau amplificado, onde conjuga-se música, dança, teatro, circo e literatura. É quase aquele povo todo da foto acima tocando instrumentos, se jogando de trapézios, dançando e fazendo caretas de palhaço para os embasbacados que estão ali embaixo na platéia fazerem a vez de bobos.

Vou colocar ali embaixo os links para baixar algumas músicas da trupe. É bem estranho a discografia deles, se é que existe mesmo uma catalogação das músicas digna deste nome. O que a gente encontra por aí é que eles têm um CD de verdade, que atende pela alcunha de "Entrada para Raros". Depois tem o áudio do DVD "Fragmentos II" que conta com músicas do "Entrada para Raros" e outras avulsas. Encontrei também algumas "agremiações" (vou chamar assim) de músicas desse povo, que recebem, na maioria das vezes, os nomes de "Outras", "A Primeira Viagem" e "Voz e Violão".

O "Entrada para Raros" e o áudio do "Fragmentos II" vou colocar para download integral. As outras agremiações poderá ser feita música por música.

Saudações!



Downloadeie o "Entrada para Raros"







Downloadeie o áudio de "Fragmentos II"




Entre aqui e baixe individualmente outras músicas

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

O Fabuloso Destino de Amélie Poulain

Geralmente, a galera por aí indica este filme e como argumento em seu favor cita o fato de Audrey Tautou ter protagonizado - ao lado de Tom Hanks - o badalado "Código da Vinci". Entretanto, o fato, na verdade, é que Audrey foi antes menos badalada: era uma menina caseira, provinciana, que gostava de filmes franceses e lia Rimbaud no original. Ela protagonizou este maravilhoso filme que agora tendes aos vossos cliques muito antes de se globalizar como estrela do cinema supranacional.
Na boa, o filme tem uma fotografia fora de série. Não sou crítico de cinema e não entendo nada de fotografia. Mas se fotografia de filme é aquilo que eu imagino que seja, este filme tem qualidade. Além disso, o roteiro é divertidíssimo e a presença de um narrador durante todo o filme é outro ponto a favor.
Enfim, recomendações feitas, aproveitem.
Só tem um problema, eu não encontrei as legendas ainda. Mas tão logo encontre, coloco junto do filme.
Ah, tem outro problema. Se vocês estiverem usando o firefox, não vai dar certo. O servidor pede o explorer e, além disso, pede também a instalação de um aplicativo pequenininho para rodar o donwload. Tão logo o aplicativo estaja instalado, o download se iniciará.

Ficha Técnica
Título Original: Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain
Gênero: Comédia
Tempo de Duração: 120 minutos
Ano de Lançamento:
2001
Estúdio: Le Studio Canal+ / Filmstiftung Nordrhein-Westfalen / France 3 Cinéma / La Sofica Sofinergie 5 / MMC Independent GmbH / Tapioca Films / Victoires Pictures
Distribuição: Miramax Films
Direção: Jean-Pierre Jeunet
Roteiro: Jean-Pierre Jeunet e Guillaume Laurant
Produção: Jean-Marc Deschamps
Música: Yann Tiersen
Fotografia: Bruno Delbonnel
Desenho de Produção: Aline Bonetto
Direção de Arte: Volker Schäfer
Figurino: Madeline Fontaine e Emma Lebail
Edição: Hervé Schneid
Efeitos Especiais: Duboi

Elenco
Audrey Tautou (Amélie Poulain)
Mathieu Kassovitz (Nino Quincampoix)
Rufus (Raphael Poulain)
Yolande Moreau (Madeleine Wallace)
Artus de Penguern (Hipolito)
Urbain Cancelier (Collignon)
Maurice Bénichou (Dominique Bretodeau)
Dominique Pinon (Joseph)
Claude Perron (Eva)
Michel Robin (Pai de Collignon)
Isabelle Nanty (Georgette)
Clotilde Mallet (Gina)
Claire Maurier (Suzanne)
Serge Merlin (Dufayel)
James Debbouze (Lucien)
Lorella Cravotta (Amandine Poulain)
Flore Guiet (Amélie Poulain - 8 anos)

Downloadeie este filme

A Outra História Americana

O filme dispensa maiores apresentações e comentários. Muitos - senão todos - de vocês já o assistiram. Mas se aceitarem um conselho meu, por favor, façam o download e o conservem em vossos HDs ou o gravem em um DVD. Vale muito a pena.
O Nelson Rodrigues falava que a gente deveria mais era reler os livros. Para ele, existia apenas uns 4 ou 5 livros dignos de inúmeras releituras. Talvez, alguns filmes sejam assim. O fato é que a internet facilita isso por democratizar o acesso, mas também dificulta pela neura que te dá em ficar fazendo download de tudo que te apetece e depois nem dá tempo de curtir tudo. Mas isso é com vocês. Eu faço o meu papel. Socializo. E só.

Ficha Técnica
Título Original: American History X
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 119 minutos
Ano de Lançamento:
1998
Título Original: American History X
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 119 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1998
Site Oficial: www.historyx.com
Estúdio: New Line Cinema
Distribuição: New Line Cinema
Direção: Tony Kaye
Roteiro: David McKenna
Produção: John Morrissey
Música: Anne Dudley
Direção de Fotografia: Tony Kaye
Desenho de Produção: Jon Gary Steele
Direção de Arte: J. Kyler Black e Dan Olexiewicz
Figurino: Douglas Hall
Edição: Gerald B. Greenberg e Alan Heim
Elenco:
Edward Norton (Derek Vinyard)
Edward Furlong (Daniel "Danny" Vinyard)
Beverly D'Angelo (Doris Vinyard)
Jennifer Lien (Davina Vinyard)
Ethan Suplee (Seth)
Fairuza Balk (Stacey)
Avery Brooks (Bob Sweeney)
Elliott Gould (Murray)
Stacy Keach (Cameron Alexander)

PS: O link para download é do servidor "megaupload". Durante o horário expediente é mais difícil fazer o download porque todos os slots estão ocupados. Mais garantido tentar depois das seis da tarde. É sério.

Faça Download deste filme (legenda embutida)

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Ana Claudia Calomeni - ele e ela

se conhecem num bloco de pierrôs em que ela é a única colombina. Ela bebe cerveja. Ele, caipirinha. Se vêem, sorriem, se beijam.

Quando nos conhecemos ele disse que gostou da minha ousadia. "Ousadia? Mas esse cara nem me conhece", pensei, mas aceitei a cantada. Na verdade, achei aquele elogio o máximo! Ficamos juntos até o bloco se desfazer no Largo dos Guimarães.

Ele não consegue parar de pensar nela. Gosta de imaginar qual é a forma do seu corpo sem fantasia. Passa horas olhando vitrines, tentando adivinhar em que tipo de roupa ela se encaixa melhor, o tamanho, o comprimento...

Um dia o vi olhando uma vitrine de roupas femininas. Admirava os manequins como se visse mulheres no lugar dos bonecos. Parei na sua frente, ele me olhou como quem não acreditasse, sorriu leve, comentou algo sobre "...a ressaca daquele dia", falou mais algumas coisas que eu não consegui decifrar, muito menos tentei entender. Meu pensamento estava preso na imagem dele refletida na vitrine. Escrevi num papel meu telefone. "Não...", ele disse, e eu recuei, "...esse não é o seu tipo de roupa", continuou, esticando o braço, e eu voltei à posição original, como se nada tivesse sido dito. Ele dobrou o papel sem reparar que o meu nome não estava lá. Me beijou no canto da boca.

Ele telefona para ela, sentindo um aperto desconjuntado no peito. Não haviam dito seus nomes, era como se se conhecessem há muito...

Acordei com a voz dele na secretária eletrônica cantando "colombina onde está você, eu vou dançar o iê ie iê. Me liga". Eu corri pra atender, mas não deu tempo. Deixou um número. Nos encontramos no Largo. "Não consigo parar de pensar em você. Quero continuar o que ainda não começamos", ele disse me olhando fundo. Eu sorri. Sempre gostei de paradoxos.

"Te amo", ela diz, mas ele não acredita, mesmo sabendo que ela não mente. Ela faz declarações de amor com a mesma tranqüilidade que acende um cigarro depois do café ou come um prato de filé com fritas. Aos cinqüenta anos um homem já tem opinião formada sobre o que é o amor e ele sabe que uma pessoa capaz de dizer te amo de forma tão natural apenas pensa sentir o que diz. "Você acha que me ama", ele responde. Ela rodopia o corpo leve, inescrupuloso, e sai, batendo a porta do apartamento. Na esquina da rua se vira e acena para ele, que recua um passo da janela, se protegendo atrás das cortinas. Ela espera alguns segundos, ele reaparece e acena de volta com um gesto duro e frio como um espasmo.

Ela levanta de leve os ombros, dá meia-volta e dobra a esquina.

Ele se senta na poltrona perto da janela, acende um cigarro e olha a fumaça.

Ele achava que me conhecia. Dizia que eu pensava que o amava. Acreditava me conhecer mais do que eu mesma. Sabe como é, coisa de homem que acha que já viveu tudo. Na época ele preparava uma tese de mestrado sobre o amor. Algo sobre manifestações amorosas à luz da sociedade pós-moderna. Acho que ele ia ter um bocado de trabalho. Na primeira vez que transamos, ele jurou que me amaria pra sempre se eu continuasse fazendo sexo oral nele daquele jeito. Ali eu percebi que ele ia ter que pesquisar muito pra desenvolver uma tese convincente. Eu não acho que um homem que jura amor eterno a uma mulher só pelo jeito que ela chupa ele entenda realmente do assunto. Talvez ele só entenda mesmo de sexo oral. O que, cá pra nós, não deixa de ser uma vantagem.

O cheiro dela. É um cheiro que ele não sabe explicar, um cheiro impossível, que ele só sente quando não sente direito, só percebe quando não presta atenção, misturado com cheiro de rosa, incenso, creme hidratante e chiclete de canela, que ela gruda nas costas da mão quando toma suco de beterraba com laranja. "Pra saúde", ela diz, brindando o copo num outro imaginário, e bebe o conteúdo quase de um gole só, de olhos fechados para não sentir o gosto. Abre um sorriso satisfeito, desfaz a careta refletida no vidro do copo, leva a mão à boca e resgata o chiclete ainda úmido.

Um dia peguei na mesinha de cabeceira da cama dele uma matéria de jornal: "Machos e fêmeas: o poder do cheiro nas relações amorosas". Ali explicava que homens mais velhos se interessam por mulheres mais novas por causa do cheiro delas. É que essas mulheres, como as fêmeas de qualquer espécie, exalam um cheiro mais forte, e isso compensa a perda progressiva do olfato dos homens mais velhos, o que também acontece aos machos de qualquer espécie. Achei aquilo tudo muito primata pro meu gosto, mas entendi porque ele ultimamente andava cheirando as minhas calcinhas.

Os dois primeiros anos deles juntos são ótimos. Ele gosta da juventude dela, do seu jeito apressado de encarar as coisas. Olha para ela e se lembra dele.

Sabe quando uma pessoa te olha tão através de você que alcança aquilo que está lá atrás e nem você enxerga mais? Pois é, não foram poucas as vezes em que ele me olhou assim. Uma vez eu virei pra trás e vi que não tinha ninguém. Achei divertido, mas foi aí que comecei a entender sem ainda saber: eu já estava só.

"Sinto uma certa pressa", ela diz. "De quê?", ele quer saber, mas ela não sabe responder. Ele gosta de palavras, explicações, e algumas ela não sabe dar.

Eu gostava da maturidade dele. Daquele jeito pouco apressado de olhar o mundo. Os cabelos grisalhos, os olhos por trás dos óculos, a calma, principalmente a calma. Uma calma típica dos que sabem e não têm medo disso, dos que sabem que nem sempre foi assim. Era aquela calma dele que eu procurava, mas eu tinha pressa, muita pressa de encontrá-la. E foi justamente aquela calma que um dia começou a ocupar espaços desconhecidos em mim e me revelou uma solidão imensa, só minha: a solidão de mim. Tive medo, muito medo, do silêncio. Era como se de repente não houvesse mais nada além das paredes daquele apartamento.

Ele a abraça. Eles transam. Ela vai embora, levando a imagem dele refletida na vitrine.

Enchi a casa de espelhos, na esperança de que muitos de nós ocupassem espaços nos quais não conseguíamos mais circular. Eu já não conhecia mais os caminhos, não era capaz de me distinguir daqueles reflexos, não sabia mais que direção tomar. Minha vida virou um labirinto povoado de fantasmas de nós dois. Quando os aços dos espelhos passaram a ser minha única realidade, fui embora.

Hoje é segunda-feira de carnaval. Pierrôs, colombinas, melindrosas, pandeiros e cuícas se misturam no Largo dos Guimarães e eu aqui, relatando um fato a fria distância, como se a história nunca tivesse sido minha. Faz tempo que ela foi embora e ainda sinto uma saudade alucinada de nós. Um fantasma vira aquela mesma esquina ali embaixo há meses e quanto mais me escondo atrás das cortinas, quanto mais cigarros acendo tentando moldar com a fumaça uma outra imagem que não a dela, mais me aflijo neste apartamento incompleto. O apartamento está em pedaços. Os espelhos aumentam um vazio que parece não ter fim, perpetuam este espaço no qual me perco e eu aqui, sentado nesta poltrona, desejando vê-la surgir de dentro deles e dizer que tudo não passou de um inocente pavor.

Outro dia, era uma segunda-feira de carnaval, cuícas, pierrôs, pandeiros, colombinas, melindrosas, se misturavam no Largo dos Guimarães. Senti saudades. Às vezes tenho vontade de voltar e explicar o pavor que senti.

Ana Claudia Calomeni (1964) é carioca formada em jornalismo pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Estreou na literatura no final do ano de 2000 com a publicação de um conto e dois mini contos no livro “TOTAL”, antologia de contos, crônicas e poesias organizada pelo poeta Cairo Trindade. No mesmo ano recebeu menção honrosa no 11º Concurso de Contos Paulo Leminski com "Por um fio de sangue", publicado na antologia.

Karnak - Vim que Venha

Composição: André Abujamra, Sérgio Bartolo, Hugo Hori, Eduardo Bid

E quando morre a gente chora né
E quando nasce a gente ri né
Mas quem nasce chora
E quem morre sorri

Bahia é terra de dois
É terra de dois irmão
Governador na Bahia é Cosme e São Damião
Quem tem que vim que venha
Quem tem que ir que vá

E a morte veio e chegou bem de repente
Prá mostra prá toda gente que a morte também vem
Foi de bazuca, tiro, atropelamento, de carroça,
De jumento, de lambreta, fusca e trem
Ninguém espera, ninguém fica esperando
Só porque é pernambucano não acha que vai sofrer
O homem gordo, o homem magro,o homem alto,
O homem baixo, o homem feio também nascem prá morrer

Conheço um cara que comeu manga com leite,
Foi picado por serpente conseguiu sobreviver
E aquele outro pisou numa taturana, teve morte instantânea
Não dá nem prá entender
Quem tem que vir que venha
Quem tem que ir que vá
E quando morre a gente fica chorando
E quando nasce a gente ri
Mas quem nasce chora e quem morre sorri

Rato de Sebo 3



"Clickque" na tirinha para lê-la em seu tamanho naturalmente normal!


PS: perceberam a evolução infame dos "click", "clique", "clickque"? Não? Só depois de eu avisar? Por que continuam visitando este blog, afinal de contas?

Rato de Sebo 2




Clique na tirinha para lê-la em tamanho normal

Rato de Sebo



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Cássio Pantaleoni - Desespantalhamundos

Desespantalhamundos

Cássio Pantaleoni


Tinha aquela menina. Fazia o padre rifar seus pecados com a ave-maria-cheia-de-graça na ponta da língua e o aleluia por debaixo da batina, em uma oferta que desassossegava até as excelências mais castas, quando a boca entreaberta presenteava a língua à hóstia.

Catequizada no rigor bíblico, nas frias salas do colégio das freiras, escolheu a comunhão para exorcizar a meninice e convocar a mulher que então vazava no quadril adolescente, época em que já emprestava um vestido de linho branco para alinhar um par de coxas fresco e arrepiar os seios, para o horror dos hábitos salesianos.

De pequena soube de sua vocação, nas brincadeiras atrás da casa, nos porões abandonados, nos esconderijos da escola, onde descobria dos meninos um outro jogo ao pé do ouvido, coisa que ainda lá não lhe conquistava a simpatia. Cuidou de ser menina até pintar de vermelho as rendas de seus segredos. Mas como a natureza exige a espécie, transformou-se naquilo para que veio ao mundo.

Aconteceu que toda a comunidade, em certo domingo de calor escancarado, deu com o diabo dentro de si, um ornamento novo para a alma tão imaculada que guardavam ao paraíso, untando a testa de queroque-te-como-toda, tonteando entre o bem e o mal, enquanto a menina, acomodada na cadeira solitária à frente da nave, filava olhares no cruza-descruza das pernas, vez que outra deixando escapar uma inocência fingida pelo canto dos olhos. Os outros, profanados, escondendo a ereção, perdiam os versículos que, no altar, o pároco resmungava já esvaziado de qualquer santidade; ela, que não se arredava da ocasião, que ali fazia palco da mímica improvisada, tentava olhares, trejeitos, com aquela oferta irrecusável de quem curva o sorriso aos quinze anos. O silêncio, uma espécie de vozerio surdo, censurável até as medidas das mais beatas, denunciava intenções que, em outras casas, pagaria por hora o aluguel do favor mundano. Desavisada de tudo, ela embalava os vícios reprimidos de uma dezena de entediados maridos, plantando uma promissória parelha de chifres nas amantes de final de mês.

Missa terminada, alcançou o sacristão, tamborilando os saltos pelos ladrilhos abençoados, confessando pressa em resolver questão que, se não tratada imediatamente, traria grandes dificuldades para as lidas da sacristia. O noviço, embeiçado no decote da mocinha, fingiu a maior atenção possível, enquanto ela acusava a mão sorrateira do João da Belinha, que trocava a moeda pela nota generosa dos dízimos de toda a gente. Uns tantos outros invejavam o deslumbrado moço que esforçava a alma no caminho reto, tão perto do cheiro da menina nova. Pela garganta do templo as mulheres escoavam doloridas, dor de inveja, de ciúme, dor de fêmea que pariu demais e já trocou os seios por um par de mamas preguiçosas, todas entocadas nas meias-calças, nos sutiãs, nas anáguas, nos vestidos abaixo dos joelhos. Restou apenas a devota, pelo padre apaixonada, mulher do tal João — Belinha por alcunha, Elizabete por certidão —, comendo a menina com um par de sobrancelhas duras e lábios contraídos, com jeito de quem descobre a calúnia depois da consagração.

O incontornável drama deu-se quando a Belinha, já desejando a orelha da guria, na ânsia de desfazer a porca imagem daquele tão seu João, tropeçou no aborrecimento, empilhando sobre o sacristão e os ameninados homens, os gestos de quem, desastrado, perde a pose, esgarçando os braços sobre o decote da delatora. Rasgou o vestido de cima a baixo, pondo à vista um par de seios empinados e adornados por auréolas rosas que firmemente apontavam para o horizonte dos olhares da matilha. Quando deu conta do acontecido, João emprestou o abraço à gazelinha, com a desculpa de um gesto nobre, na oportunidade única de chegar perto daquela preciosidade. O puta-que-te-pariu que esbofeteou à cúpula daquela assembléia divina despiu João de seu engenho, entoado pela mocinha que ali de Eva posava emputecida, mesmo que nos mais peculiares contornos de sua alma encontrasse o despudor, a desavergonhada vontade de oferecer a pia aos jorros incontidos dos mais recatados. Belinha, que desabrochava um despeito, ainda embrulhada entre os embeiçados, viu nas rugas jovens do marido um desejo de carne, uma vontade de sujeira, de emporcalhar o mundo todo, e deu-se conta, como aos doze, que dos homens pouco lhe coubera, senão um casamento apressado aos dezessete, umas poucas noites sem o gozo ávido, e um comichão que prometia e não cumpria, deixando gélida as entranhas da mulher que então ia sofrendo. Ele, debruçado ao pé da deusa, com a cara inchada e a elegância desfeita, ruminava a vergonha daquele ímpeto descontrolado que o lançara aos seios jovens da donzela.

Porém, nos enquantos de todo aquele quadro, entremeava um desespero no sacristão, algo que lhe abismava os critérios puros, mas que de outra sorte evocava a Trindade, os santos, os arcanjos, todo o tipo de visões de benevolência e inclinação frígida que só quem reza mais do que pensa pode manter. Enquanto salivava, maldizia. Maldizia o padre, o João da Belinha, maldizia a própria Belinha, a Virgem, a menina, todos que ali se enlaçavam na lascívia, nesse ou no outro mundo. Meu Deus, sou apenas um homem! gritou desvirtuado, jurando arrancar a pequena de tantas mãos ensebadas.

Todos calaram. Ainda voava o eco pelos cantos do altar quando Belinha avisou: é apenas uma fedelha! Tarde demais. A outra, despojada dos trapos, empinou o orgulho, oferecendo o seio, a boca e o mistério ao sacristão. Apenas homens, apenas uma menina, apenas as duras penas dos humanos, a insuperável sina dos humanos, pensou o já-não-tão-beato noviço, enquanto esfregava os beiços na fêmea.

Belinha, horrorizada, não se conteve. Atirou-se aos desavergonhados, esbravejando a pouca-vergonha que já então não era mais de João. Os outros, pasmados, escorreram a inveja disfarçada, emoldurando a cena toda com absurdos-que-vergonhas-onde-já-se-viu. João nada fez senão arrebanhar o grupo porta afora, com o tesão entre as pernas.

Na igreja, a mácula descurou a castidade.

Acordou, ao lado de quem não valia a pena, com as entranhas secas, no quartinho atrás da igreja, encarando o crucifixo que na parede aborrecia os demônios. No banheiro, lavou as pregas larga-fendadas no balde, sabão de pedra e água benta; depois veio a toalha, prometendo um nada-não, uma absolvição.

Vestiu os trapos, bateu a porta. Ajeitou a menina que ainda era, batizada, ganhando as ruas com quinze anos.


Cássio Pantaleoni (08/08/1963), escritor, filósofo e ensaísta, é gaúcho e reside em Porto Alegre (RS). Dono de formação eclética, é Mestre e Bacharel em Filosofia, com complemento curricular em disciplinas da Psicologia Social e Psicologia do Desenvolvimento. Atua profissionalmente na área de Soluções de Software para Processos de Gestão Empresarial. Devido à sua inquieta curiosidade multidisciplinar desenvolveu conhecimentos em diferentes áreas de estudo, demonstrando capacidade de dissertar sobre temas diversos, uma concessão ao entendimento de que a história do conhecimento humano é a história do entrelaçamento de idéias.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Apresentando Baia e os Rockboys

Então, é pra funcionar como uma introdução para quem não conhece essa banda. Assistam o vídeo e, se rolar identificação, baixem uma coletânea com grande parte das músicas deles na postagem abaixo.

Baia e os Rockboys - Coletânea

Para quem assistiu ao vídeo acima, dispensa-se apresentações!

Baia e os Rockboys

103 Chapéus de Couro
Anjo Entorpecido
Baia e a Doida
Ballad of a Thin Man
Bebopsoul
Bebopsou Ao Vivo
Bicho Homem
Blowing in the Wind - Habbeas Corpus
Cabeça de Babel
De Bem
Eu e a Guimba
Eus
Eus Ao Vivo
He was a friend of Mine
Hurricane
It ain´t me babe - Bicho Homem
Jokerman
Lado Oposto
Love Minus Zero - No limite
Monkey Man
Natureza Humana
O Comedor de Calango
Para Carro
Pesadelo n 22
Por que - Check up
Pra Cantar 3x
Rachando a Cabeça
Rock Feeling Good
Suco de Quiabo
Trem
Trilha Sonora da Vida

Downloadeie a coletânea acima: parte 1
parte 2

Katarse - A Prosaica Onipresença da Criatura

Embora eu ache uma tremenda frescura e de uma desnecessária "breguice" a mania de ficar substituindo a letra "c" pela letra "k" em tudo o que é palavra brasileira sob a justificativa de deixar mais estiloso, confesso com as mãos para trás e a cabeça baixa que este paulistanos aí do lado são extremamente "kompetentes". Musicalmente falando.
A palavra "catarse" (no português correto) deriva do grego kátharsis, que, segundo um dicionário merreca da internet, significa, dentre outras coisas, "purificação", "evacuação", "purgação".

Abre parentesis.Agora, gente, não venham confirmar o pressentimento que estou tendo de que vocês riram, mesmo que em silêncio, da tal da "evacuação". Por favor, hein! Mentes sujas. É num sentido metafísico, metafórico, metaevacuativo que está ali. Vocês, crianças! Fecha parentesis.

Aconteceu uma coincidência ontem. Enquanto eu pensava em fazer o upload deste disco para colocar no blog, uma amiga minha disse que voltava de um programa de rádio que o grupo dela estava transmiti
ndo pela web. Era um programa sobre entrevistas e tal. Quando indagada sobre o nome do programa, qual não foi meu legítimo espanto quando ouço da voz dela a palavra "Catarse". Está aí, tão simplesmente, o motivo desta postagem. Uma homenagem à coincidência e a iniciativa das meninas.

PS: o endereço da rádio na web é www.unioeste.br/kula

PS2: A banda diz que tem influências de Arnaldo Antunes, André Abujamra, Eels, Jorge Mautner, Leonard Cohen, Nélson Cavaquinho, Nick Cave, Pearl Jam e principalmente Tom Waits. Alguém aí conhece esse tal de Tom Waits? Se souber me mandem alguma dica!

Grato!

01. Zzz...
02. Fênix
03. Espantalho
04. Funeral
05. Lembrete
06. Telutelinho
07. O céu
08. Saída
09. Super-herói fora de série
10. Tortura nunca dantes catalogada
11. Tchusté-nigô
12. Você já sabe
13. Contando dias contados
14. Acorda
Downloadeie a pulguinha